Análise | Violência e Crimes

Ataque na Catedral

O acontecimento é um alerta sobre os perigos que o armamento da população pode ocasionar. Suspeita-se que o atirador sofria com um grave quadro de depressão e a junção com a arma de fogo foi fatal: seis mortos, a começar por ele.

Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

A missa do meio dia tinha terminado há pouco na Catedral Metropolitana de Campinas, quando Euler Fernando Grandolpho, 49 anos, começou a atirar nas pessoas que ainda estavam no local. Os mais de vinte disparos resultaram na morte de cinco homens e deixaram mais três pessoas feridas. O atirador, após confronto com a polícia, se matou no local com um tiro na cabeça.

O ataque ganhou grande cobertura midiática sendo a motivação do crime a principal pergunta que a mídia buscou responder. A descrição de Euler como um homem solitário, que vivia com o pai e que já apresentara um quadro de depressão, tem se mostrado uma das principais chaves de leitura para compreender o caso. Também ganhou destaque o testemunho das vítimas, seja daquelas que sobreviveram ao atentado como também das que agora terão que viver com a perda de um ente querido.

Diante deste acontecimento dois pontos cabem ser destacados. O primeiro é a depressão, apontada como possível motivadora do crime. Em entrevista, membros da família de Euler reconhecem que o atirador apresentava um comportamento estranho e temiam inclusive seu suicídio. O homem que se afastava cada vez mais das pessoas e quase não saía de casa, se dizia perseguido. No entanto, apesar de todos os indícios, não estava recebendo o tratamento adequado para tratar de uma possível depressão ou até mesmo para diagnosticar outro tipo de transtorno mental.

Uma pesquisa recente divulgada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) revelou que a depressão já atinge 4,4% da população mundial, sendo o Brasil o país que apresenta o maior índice da doença em relação a outros países latino-americanos. Segundo a pesquisa, a doença atinge 5,8% da população, o que equivale a 11,5 milhões de brasileiros. No entanto, o tratamento para a doença ainda está distante para muitos brasileiros, que contam com o Sistema Público de Saúde. A demora no diagnóstico e também no acesso a um tratamento de qualidade têm consequências graves como o afastamento do trabalho, o abandono da vida social e, em casos extremos, o suicídio.

O segundo ponto é o acesso às armas. Segundo a polícia, Euler teria trocado uma moto pelas duas armas usadas no crime. O atirador obteve o armamento de forma ilegal, o que é um alerta para a necessidade de medidas mais rigorosas no combate à circulação de armas ilegais no país.

Mesmo que o atirador tenha usado armas ilegais, este acontecimento também realça a importância da permanência do Estatuto do Desarmamento, criticado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro, que teve como uma das bandeiras de campanha facilitar a posse de armas de fogo (permissão para ter uma arma em casa) e também o porte (direito de carregar a arma, o que hoje é restrito a algumas categorias profissionais) para a população.

Segundo o Atlas da Violência 2018, 71% dos homicídios cometidos em 2016 foram por arma de fogo e o índice poderia ser maior, não fosse o Estatuto do Desarmamento. Apesar de apoiada por parte da população como medida para o combate à violência, especialistas em segurança pública alertam que o armamento da população não reduzirá a violência e sim ampliará o número de homicídios, feminicídios, suicídios e também mortes por disparo acidental, cometidos não só por bandidos, mas também pelo “cidadão de bem”.

Fabíola Souza

Doutora em Comunicação Social pela UFMG e pesquisadora do GRIS



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