Nosso Radar de Celebridades tem com objetivo identificar e apresentar um grande painel das celebridades de nosso tempo - figuras públicas brasileiras que têm alcançado destaque e adesão junto a públicos significativos.

Conheça a proposta

Rita Von Hunty

Campo de exposição

Rita é acessada predominantemente pelo seu canal, Tempero Drag, que conta com 837 mil inscritos e publicações semanais de vídeos. Existem alguns quadros disponíveis no canal, como, por exemplo, o Especial Karl Marx e o Mulheres F*d@, que conta com a participação da assessora de Guilherme, Mair G, também produtora de conteúdo. O perfil no Instagram é da própria drag e possui 700 mil seguidores. No Twitter, o perfil é do programa (@temperodrag) e reúne 25,8 mil seguidores. Ela também atua como colunista da revista Carta Capital, onde publica um conteúdo a cada 15 dias.  Além de palestras, debates e aulas, atualmente Rita participa de diversas lives com outros famosos e também é recebida como convidada em programas de televisão, como o Saia Justa, do canal GNT.

Dados coletados em 01/07/2021.

 

Acontecimentos

  • Em 2014, Rita participou da primeira temporada do programa Academia de Drags e, apesar de não ter conseguido chegar à final, garantiu o quinto lugar e o posto de Miss Arrasa Bicha, equivalente a Miss Simpatia.
  • Em 2015, foi responsável pela abertura do show de Jinkx Monsoon, vencedora da quinta temporada do reality RuPaul´s Drag Race, da Netflix, e queridinha dos fãs brasileiros. No mesmo ano, participou do programa da apresentadora Xuxa Meneghel, na  Rede Record, alcançando ainda mais visibilidade.
  • Durante o período eleitoral de 2018, um vídeo de Rita chamado Consciência de classe viralizou como conteúdo contra o então candidato Jair Bolsonaro e conta com quase um milhão de visualizações.
  • Desde 2019, Guilherme comenta a respeito dos preparativos para o primeiro livro de Rita, que será lançado pela editora Planeta. Mas, apesar das expectativas, o livro ainda não saiu.
  • A parceria entre Rita e a Carta Capital começou em 2019, quando a drag estreou seu programa “O Gabinete” no canal do YouTube da revista.
  • Só esse ano (2021), Rita teve quatro participações no canal a cabo GNT, sendo três vezes convidada do programa Saia Justa e uma vez no Bem Juntinhos, comandado por Fernanda Lima e Rodrigo Hilbert.

 

Valores e públicos evocados

Além do sarcasmo e do humor, Rita Von Hunty é conhecida por sua intelectualidade e didática para explicar temas e autores complexos, como, por exemplo, Karl Marx, que é chamado carinhosamente pela drag de Seu Carlinhos. Certamente, o desenvolvimento de Guilherme enquanto professor e pesquisador nutre a criação de sua persona e aumenta a credibilidade do discurso de Rita. Sempre que pode, o ator faz questão de enaltecer o papel da universidade, ressaltando não apenas autores (como Foucault, Adorno e Raymond Williams), como alguns professores da USP, considerados por ele bastante iluminados. Nota-se, portanto, que há uma vinculação entre Rita e um público mais formador de opinião, que valoriza o estudo, a ciência e as referências teóricas que sempre ponderam suas discussões.

Há também uma preponderância ideológica que marca a relação entre Rita e os públicos, uma vez que ela assume um posicionamento anticapitalista e marxista. Rita passou a ser chamada por alguns veículos de musa esquerdista e namoradinha comunista do Brasil. Além do apelo nitidamente político, como representante das drags brasileiras e ícone do universo LGBTQIA+, ela também mobiliza públicos que se formam em torno dos debates sobre gênero, sexualidade e diversidade. 

Dessa forma, é possível perceber como a performance de Rita tem potencial para convocar públicos distintos; não apenas os que se vinculam às suas ideias e compartilham valores como conhecimento, respeito e ironia, como também aqueles que rejeitam as discussões propostas pela drag, muitas vezes sem nem saber ao certo sobre o que tratam. Às vezes, só o fato de ser uma drag queen famosa pode intimidar um público conservador e religioso que abomina a performance de gênero; outras vezes, é o discurso contra a direita e as estruturas sociais criadas pela elite que incita um público disposto a destilar ódio contra o que acreditam ser a personificação do comunismo.

Independente dos públicos mobilizados, os atributos que mais se destacam na figura de Rita são sua ousadia, seu humor ácido, sua inteligência e a habilidade de articular e democratizar temas dentro do contexto midiático atual.

 

Pontos de interrogação

Parte do movimento feminista – a corrente do feminismo radical – considera que o homem fantasiar-se de mulher no Carnaval seria ofensivo, assim também como as drags queens. Para esse grupo, as drags estariam fazendo troça do feminino e esculachando a feminilidade e, nesse sentido, Rita eventualmente sofre algumas críticas. 

Para Guilherme*, “invalidar a drag na sua gênese, na sua ontologia, como um processo machista e misógino, seria como invalidar o cinema, a escultura, a pintura”, já que “quem estabelece o feminino e o masculino é a cultura”. Ele ressalta que “drag nunca foi sobre se vestir de mulher, mas sobre mostrar que gênero é uma construção social. Então, é um movimento disruptivo e um levante cultural […] não tem troça com o feminino, não tem piada sendo feita”

*Em entrevista para a revista Continente, em fevereiro de 2021.

 

Fernanda Medeiros, doutora em Comunicação pela UFMG, pesquisadora e professora da PUC Minas.

Biografia

Rita Von Hunty é uma drag queen que nasceu no Carnaval de 2013, graças à performance de Guilherme Terreri de Lima Pereira, um estudante introvertido e discreto que, na época com 25 anos, cursava Letras na USP e dava aulas particulares de inglês e literatura inglesa. Rita é uma persona que ganhou visibilidade nacional como uma elegante senhora de meia-idade dos anos 1950, dando aulas na internet sobre sociologia, política, marxismo e anticapitalismo, baseadas em um humor sagaz e muita fundamentação teórica e científica. Atualmente, a drag queen é reconhecida por seu trabalho de formação política e de comunicação na disputa das redes e convidada para entrevistas e debates em diversos programas, inclusive da mídia hegemônica.

De acordo com Rojek (2008, p. 26), Rita se enquadraria no conceito de celeator, “um personagem fictício que ou é momentaneamente ubíquo ou se torna um item institucionalizado da cultura popular”, satisfazendo expectativas diversificadas do público por meio de uma figura que concentra a época. Dessa forma, celeatores são criações satíricas que, a partir de um viés cômico, ressaltam e criticam valores e comportamentos em voga durante determinado período. No entanto, o autor ressalta que, ao contrário das celebridades tradicionais, no caso dos celeatores não existe a duplicidade do “eu público” e do “eu privado”; “o rosto público é totalmente uma criação ficcional” (ROJEK, 2008, p. 29). Sob essa perspectiva, Rita é uma persona mais complexa, pois evidencia um lugar de performance que é indissociável da história de Guilherme Terreri.

Antes de cursar Letras, Guilherme se formou em Artes Cênicas pela UniRio e trabalhou como ator durante alguns anos antes de se mudar para São Paulo. Ele explica que, como uma dona de casa vintage e debochada, Rita também segue um visual inspirado em grandes nomes da Hollywood antiga, como Carmen Miranda, Marilyn Monroe, Sophia Loren e algumas pin-ups. O nome presta uma homenagem à atriz Rita Hayworth e à dançarina burlesca Dita Von Teese, 

Depois da “montação” no carnaval, o ator recebeu uma série de convites para participar de shows e festas em São Paulo, até que foi abordado por uma produtora de vídeos com interesse em lançar um programa estrelado pela drag queen no YouTube. Assim nasceu o canal Tempero Drag, em abril de 2015, inicialmente focado em culinária vegana, com pitadas de política e toques de uma cozinheira politicamente incorreta. O programa era feito de maneira improvisada e contava com a presença de outras drags e pessoas influentes no meio LGBTQIA+ como convidadas. 

Em 2017, foi convidada para apresentar o programa Drag Me As a Queen, do canal E!, ao lado de Ikaro Kadoshi e Penélope Jean, que, juntas, estrearam o primeiro reality brasileiro comandado por drags, e continuam até hoje.

Por causa do acirramento da conjuntura política do país, especialmente a partir de 2018, o canal do YouTube foi organicamente se tornando um espaço mais conteudista, voltado à ideia da educação. Guilherme conta com uma equipe para gravar e editar os vídeos, que, apesar de não aparecer, é representada pela figura de Roxelly, um tipo de estagiária maltratada que é sempre citada por Rita. O sucesso da virada possibilitou a oferta de um curso chamado Curso Revolucionário da Rita Von Hunty, que viajou por diversas cidades do Brasil.

Apesar de Rita dizer algumas coisas sobre sua vida antes da fama, como, por exemplo, que foi datilógrafa de Getúlio Vargas e Ministra de Afazeres Subversivos de João Goulart, Guilherme tenta manter sua vida privada reservada da exposição que conduz as redes sociais.