A Operação Carne Fraca sacudiu o noticiário e as conversas cotidianas pelo país. A denúncia é que, segundo a Polícia Federal, fiscais do Ministério da Agricultura estavam recebendo propina para autorizar o comércio de carnes em estado indevido, com quantidades químicas e produtos não regulamentados, ou mesmo carnes em estado de podridão com embalagens trocadas após a data de vencimento. A PF alegou que essa foi sua maior operação já feita: cerca de mil policiais cumprindo, em seis estados, 27 mandados de prisão preventiva, 11 de prisão temporária, 77 conduções coercitivas e 194 mandados de busca e apreensão.
Semanas após a deflagração da operação – que investiga a produção adulterada e venda ilegal de carnes por frigoríficos, como as dos conglomerados BRF (Sadia e Perdigão) e JBS (Seara e Friboi) – ainda há reverberações desse acontecimento na mídia e sociedade. O que um acontecimento desta magnitude revela?
Observemos alguns efeitos: a imagem do agronegócio brasileiro sentiu, no mercado global, o impacto negativo das denúncias, enquanto, aqui, notou-se o desespero dos consumidores sobre os produtos principalmente de grandes marcas de carne e congelados. A desinformação em torno da operação é grande: uma carta do Instituto de Defesa do Consumidor para o Ministério da Justiça e o Ministério da Agricultura pede esclarecimentos à população sobre os recalls e suspensões, e exige maior transparência da operação para a sociedade.
O estardalhaço da Carne Fraca suscitou várias desconfianças com ares de “teoria da conspiração”, catalisadas nas redes sociais digitais. Ainda que as teorias não se confirmem, é inegável que os resultados da operação e de sua cobertura foram convenientes tanto para interesses estrangeiros desejosos de diminuir a competitividade de “nossas” empresas, quanto para o (des)governo Temer, levando em conta que o foco das notícias deixou de ser, ao menos por um momento, a “onipresente” Lava-jato e medidas que apontam para a precarização do trabalho brasileiro.
Além da aparente estratégia da PF em usar a grande mídia como fator de pressão (construindo a operação de tal forma a obter a maior visibilidade possível), o noticiário também exagerou, “sensacionalizou”. Tanto que alguns veículos relativizaram o alarmismo e procuraram separar dúvidas e exageros de fatos apurados até agora, por exemplo, explicando o suposto caso do “papelão na carne”. Como as empresas investigadas patrocinam a grande mídia, o terreno para “teorias da conspiração” sobre o mea-culpa do noticiário também é fértil.
De um lado, o Governo Federal tenta minimizar o “pânico” gerado pela operação na sociedade e no mercado nacional, reforçando, por exemplo, que são investigados apenas 0,43% dos 5 mil frigoríficos no país. Além disso, órgãos estatais e civis criticaram as irregularidades das investigações. De outro lado, é perceptível um medo público em torno da ameaça de estamos diante um esquema criminoso maior do que parece. O acontecimento ainda não foi normalizado.
Afonso Sepulveda
Mestrando do PPGCOM-UFMG
Pesquisador do GRIS
Gáudio Luiz Freddi Bassoli
Mestre em Comunicação pelo PPGCOM-UFMG
Pesquisador do GRIS