Análise | Especial Poder e Política

Segurança: uma agenda que ganha cada vez mais voto

Entre os atores que protagonizaram as eleições municipais de 2020, é preciso destacar os profissionais ligados à área de segurança. Comparado a 2016, eles tanto tiveram crescimento no número de candidaturas quanto no total de eleitos.

Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral, no primeiro turno, dos cerca de oito mil candidatos ligados à área de segurança – o que inclui bombeiro militar, membro das Forças Armadas, militar reformado, policial civil, policial militar ou nome na urna de cunho militar – 10,2% foram eleitos, sendo 50 como prefeitos e 809 como vereadores.

Se, em 2018, a aproximação à figura do então candidato Bolsonaro se refletia no aumento de votos, em 2020, muitos candidatos preferiram continuar apostando nas pautas do presidente sem uma associação explícita à sua figura. O estado do Ceará é um caso emblemático de duas candidaturas que buscaram essa dissociação.

Ao disputar a prefeitura de Fortaleza, Capitão Wagner preferiu não centrar suas propostas apenas na área da segurança pública, em uma tentativa de se desvincular da figura do presidente e da extrema direita. Apesar de não ter conquistado a  prefeitura (recebeu 48,31% dos votos válidos), Wagner é uma figura política de crescente importância no estado. Já foi vereador, deputado estadual e federal. Sua força política ultrapassa o apoio presidencial, tendo ganhado reconhecimento por apoiar greves ilegais e motins de trabalhadores da segurança pública em 2011, 2012, 2013 e, recentemente, em 2019, quando apresentou projeto de lei na Câmara Federal concedendo anistia aos Policiais e Bombeiros Militares que participaram do movimento grevista ilegal.

Outro candidato de destaque foi Vitor Valim, comunicador-político oriundo de telejornal policial, que foi eleito prefeito de Caucaia, região metropolitana de Fortaleza e segundo colégio eleitoral do Ceará. Apesar de não ser um profissional diretamente ligado à área da segurança, ele faz parte do fenômeno de uma outra forma – é apresentador de um dos telejornais policiais mais conhecidos do estado, o Cidade 190.

Cada vez mais presentes na política institucional, os comunicadores políticos levam para esta atuação o tipo de postura que assumem nos programas que apresentam. Favoráveis às forças de segurança e às suas demandas, eles contribuem para o fortalecimento do imaginário social da insegurança e enaltecem, muitas vezes, os desmandos policiais além de também cometer uma série de violações de direitos humanos, como a exposição indevida de pessoas e famílias, o desrespeito à presunção de inocência, o discurso de ódio e preconceito etc.

Ainda que as candidaturas dos policiais continuem associadas à pauta da segurança pública, manutenção da ordem e a defesa dos costumes – questões valorizadas também pelo bolsonarismo –, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública demonstra um movimento importante. Em 2018, 77,7% dos policiais candidatos estavam em partidos de direita e ultradireita; já em 2020, foram 57,5%. Os partidos de centro-direita ocuparam o segundo lugar, com 30,2% das candidaturas de policiais. E se olharmos o percentual de candidatos eleitos, os de centro-direita (representada por partidos como MDB, PP e PSD) conseguiram um desempenho superior.

Mais do que um sintoma do bolsonarismo, a crescente participação dos agentes de segurança na política revela um movimento desses atores na autorrepresentação enquanto categoria com interesses e demandas específicos. Como destaca reportagem da Piauí, em 2018, policiais e membros das forças armadas (ativos e inativos) representavam 3,8% do eleitorado nacional. Se acrescentarmos a essa conta os seus familiares, a porcentagem é muito maior, podendo chegar a 9% da população brasileira. Tal eleitorado desperta também o interesse dos partidos políticos na filiação de candidatos com esse perfil.

No campo dos valores, a opção por candidatos que se apresentam como promotores da segurança e da ordem revela não apenas um desejo de segurança,  mas também a adesão de parte da população a discursos simplistas de combate à violência como intolerância ao crime e ao criminoso, armamento do “cidadão de bem” e o enrijecimento das leis.

Chloé Leurquin, jornalista, doutoranda em Comunicação Social (UFMG) e pesquisadora do Gris
Fabíola Souza, professora substituta no Departamento de Jornalismo da UFOP e pesquisadora do Gris



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