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Ocupa Predinho: a mídia mineira no epicentro da crise política

Ex-sede do jornal Hoje em Dia, ocupação de imóvel da rua Padre Rolim, em Belo Horizonte, converge demanda trabalhista local e crise política nacional.
Foto: Isis Medeiros / Brasil De Fato

Foto: Isis Medeiros / Brasil De Fato

Se para Louis Quéré, há acontecimentos que podem transcorrer no dia a dia sem receber importância especial, outros se tornam mais marcantes, a ponto de se tornarem referências em uma trajetória individual ou coletiva. É o caso então de perceber como, em apenas 48 horas de duração (terminou no sábado, dia 3 de junho), a ocupação do “predinho” da ex-sede da Ediminas, empresa que publica o jornal Hoje em Dia, na rua Padre Rolim, 652, em Belo Horizonte configura exemplo de convergência simultânea dos dois casos. Isso porque, de um lado, o “predinho” ficou no epicentro político marcante da crise brasileira ao ser mencionado em um dos áudios da Operação Patmos. Por outro, deu visibilidade a uma luta já quase invisível, como indicada por Kerison Lopes, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais, em nota: “a repercussão no país e fora dele deu visibilidade à causa dos demitidos, que era desconhecida até mesmo por muitos colegas em Minas Gerais.” Em documento de 15 pontos, o movimento explica as razões da ocupação e a cronologia de transição do local.

O endereço tornou-se encruzilhada de acontecimentos múltiplos em meio à crise política brasileira porque para ali convergiu não só reflexos do desdobramento mais recente da Operação Patmos, antecipada por Lauro Jardim  em O Globo no dia 17 de maio passado, mas também como reflexo de uma demanda trabalhista que se arrasta por mais de um ano, quando cerca de 150 jornalistas, gráficos e funcionários da administração do jornal Hoje em Dia foram demitidos sem os devidos direitos trabalhistas – inclusive sem o salário do último mês de trabalho.

Cinco dias após a divulgação deste áudio entre Joesley Batista e Aécio Neves, o Estado de S. Paulo publicou  matéria apurada  a partir de trecho do mesmo, no qual “o sócio da JBS disse ter repassado R$ 17 milhões a Aécio por meio da compra superfaturada do prédio em Belo Horizonte, de propriedade de um aliado do senador.” Ao jornal, o dono da Ediminas à época da negociação, Flávio Jacques Carneiro, negou irregularidades na venda do prédio. Em texto de despedida de sua coluna na Folha de S. Paulo, Aécio reafirma inocência e diz que tais acontecimentos foram “originados de delações de criminosos confessos, a partir de falsos flagrantes meticulosamente forjados”.

Atualmente, a Ediminas pertence ao ex-prefeito de Montes Claros, Ruy Muniz, marido da deputada Raquel Muniz (PSD-MG), mas hoje funciona em imóvel na região do Prado, em Belo Horizonte, sob a direção do filho Tiago Muniz. A Ediminas emitiu nota de esclarecimento sobre o fato, na qual diz que vem “cumprindo rigorosamente a legislação trabalhista”, ao que foi contestada pelos ex-funcionários, que também publicaram nota em contraponto.

Assim é que, no dia 1º de junho, capitaneadas pelos sindicatos dos trabalhadores do local e por movimentos sociais, cerca de 200 pessoas ocuparam o prédio e realizaram atividades culturais e debates gerando, ironicamente, com a ocupação de uma ex-sede de jornal, um fato midiático de convergente encruzilhada de acontecimentos.

Nísio Teixeira
Professor do Departamento de Comunicação Social da UFMG
Membro do GrisLab



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