Análise | Celebridades e Figuras Públicas Poder e Política

Celebrização da política

Vote Datena para prefeito e Donald Trump para presidente!

A política é um mundo que requer figuras públicas com imagens sólidas, baseadas em caráter e ideologia. Vence quem melhor se apresentar como capaz de conduzir uma cidade, um estado ou um país. Mas em um momento conturbado como o atual, quando há fracas referências políticas no debate público, a celebrização mostra a que veio. Nesta breve análise, falamos sobre a questão circunstancial que promoveu Datena a pré-candidato à prefeitura de São Paulo e Donald Trump a concorrente à presidência dos EUA.

Os apresentadores Donald Trump e Datena transformam fãs em eleitores em nova empreitada na política

Os apresentadores Donald Trump e Datena transformam fãs em eleitores em nova empreitada na política

A política é construída em torno de figuras públicas que dominam a retórica e a oratória, além de defenderem posições ideológicas em prol de um eleitorado. Os políticos são profissionais em convencer um público de que ele é a melhor escolha. Mas em tempos conturbados, de crises políticas e econômicas, essas referências não estão mais tão sólidas quanto antes, mas fluidas, pulverizadas, deterioradas nesse espaço público que suplica por debates de qualidade. Nesse campo nebuloso, em que muitos políticos não conseguem sustentar suas imagens públicas tão bem, o fenômeno contemporâneo da celebrização dá as caras. Dois acontecimentos recentes mostraram como as fracas referências políticas podem levar à ascensão de personalidades famosas ao patamar de aspirantes a governistas.

O primeiro caso a que nos referimos é o acerto do apresentador de televisão José Luiz Datena com o PP para sua pré-candidatura à prefeitura de São Paulo nas eleições de 2016. O deputado estadual da legenda Delegado Olim chegou a proclamar que “nasce uma nova política para São Paulo”. Aclamado por milhares de telespectadores como um defensor da segurança, Datena deve usar o tema como mote de sua campanha. O apresentador foi sondado por PSB e PSDB, mas optou pelo partido que também abriga o deputado federal Paulo Maluf. O jornalista estaria, segundo algumas pesquisas, bem posicionado para concorrer à altura com o atual gestor da capital paulista, Fernando Haddad, do PT, que é bem avaliado por apenas 20% dos paulistanos, segundo a última pesquisa Datafolha.

O célebre, segundo Vera França, “se torna conhecido por muitas pessoas, reconhecido por aquilo que é ou faz, cultuado enquanto uma certa excepcionalidade digna de admiração e reverência”. Na contemporaneidade, importam o meio pelo qual a fama ocorre e o caráter circunstancial. Além de ocupar lugar de destaque, ter bom desempenho no seu trabalho e possuir muita visibilidade, Datena conta com o carisma que, lembramos, é interacional. A todo tempo, o apresentador negocia e confirma sua imagem pública. As celebridades defendem o que a sociedade, em determinado momento histórico, valoriza. Assim, a candidatura de Datena implica em enxergar que ele está em sintonia com um quadro de valores e com o centro de poder da sociedade brasileira. Lembremos que os valores que ele prega em seu programa são moralmente tradicionais, em consonância com os discursos que vêm ganhando destaque no país.

Podemos pensar o mesmo do enorme circo que o empresário e apresentador de televisão norte-americano Donald Trump montou em torno de sua provável candidatura à presidência dos Estados Unidos pelo Partido Republicano. Este não possui um concorrente forte, e os democratas só conseguem recorrer a Hilary Clinton para a sucessão de Barack Obama. A circunstância foi essencial para o sucesso da empreitada do magnata que, apesar de ter sido criticado por diversas declarações negativas – como a insinuação de que a mediadora de um debate com pré-candidatos estaria de TPM ou menstruada – conseguiu formar um público republicano cativo.

O que será de Datena e Trump só o tempo dirá. Afinal, um acontecimento continua acontecendo enquanto afetar pessoas e tiver reverberações. Mas é importante lembrar que a falta de referências políticas mais sólidas não necessariamente será preenchida por celebridades circunstanciais. Ambos devem seguir na luta de negociar e confirmar suas imagens públicas a todo o instante, além de se aproximar dos valores em voga na atualidade. Tiririca e Romário estão aí para provar que é possível.

 

Juliana Ferreira

Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social da UFMG e pesquisadora do Gris.



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