No dia 26 de julho, Donald Trump revogou uma decisão da administração Obama de incluir nas Forças Armadas pessoas trans. O argumento utilizado por Trump foi de que as Forças Armadas não podem arcar com os gastos médicos que uma pessoa trans necessita e deve focar em “vitórias decisivas e esmagadoras”. O anúncio foi feito em conta pessoal no Twitter¹, uma prática bastante frequente e constitutiva do modus operandi de Trump.
Em resposta à medida, as Forças Armadas canadenses tuitaram²: “Nós recebemos canadenses de todas orientações e identidades de gênero.” A publicação foi acompanhada das hashtags #DiversityIsOurStrength, #ForcesJobs e de uma foto ilustrando a banda militar tocando na rua com bandeiras LGBTs.
Percebemos assim como um acontecimento pode rapidamente acionar diferentes públicos diante de uma questão de interesse social. É importante perceber como ambos os posicionamentos casam com os projetos políticos de cada país. De um lado, temos um governo que desmantela avanços sociais e políticas públicas, e do outro uma administração preocupada com a inclusão de grupos historicamente marginalizados de suas instituições.
No Brasil, a temática segue caminhos contraditórios. Nosso país é o que mais registra mortes de LGBTs motivadas por LGBTfobia no mundo. Segundo dados do Grupo Gay da Bahia e da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais*, os números continuam crescendo e atingem atualmente os maiores índices já registrados. Em 2016, foram cerca de 340 LGBTs assassinados por motivação LGBTfóbica e, neste ano, a média está sendo de um LGBT assassinado a cada 25 horas. As travestis e os transexuais são os mais vitimizados: foram 868 assassinatos nos últimos 8 anos, o dobro do segundo país com maior número de registros.
No entanto, em meio a esse contexto de genocídio da população LGBT, um pequeno grande passo foi dado no último mês: os transgêneros brasileiros agora podem fazer seu CPF utilizando o nome social, sem que tenham necessariamente feito a cirurgia de redesignação sexual**. No campo da representação midiática, a diversidade sexual também está em alta. Na novela global A Força do Querer, a personagem Ivana está se descobrindo como homem trans gay. A relação entre identidade de gênero e orientação sexual da personagem abre espaço para que o público da novela acompanhe as próprias descobertas da personagem. A Força do Querer tem tido boa aceitação por parte do público, com a maior audiência para o horário em quatro anos***.
Todo esse contexto confuso, com avanços e retrocessos, estatísticas que não batem com representações mostra que analisar a contemporaneidade é mais difícil do que simplesmente identificar uma única tendência, uma única verdade. Ainda mais se pensarmos no governo atual e o projeto político que tem tentando implementar. De forma similar à Trump, a administração de Temer vem sistematicamente anulando conquistas dos movimentos sociais e revertendo ações inclusivas realizadas pelos governos anteriores. A nós, resta a busca por uma compreensão desse contexto e a esperança de que as conquistas alcançadas não sejam – elas também – golpeadas.
Vanrochris Vieira
Mestre em Comunicação pelo PPGCOM-UFMG e professor da Universidade Vale do Rio Doce
Pesquisador do Gris
Maria Lúcia de Almeida Afonso
Mestranda em Comunicação pelo PPGCOM-UFMG
Pesquisadora do Gris