Análise | Poder e Política

Essa Roda já foi mais viva…

Muita asneira, perguntas rasas e respostas mais rasas ainda marcaram a participação do presidenciável Jair Bolsonaro no programa Roda Viva.

Foto: Reprodução / YouTube

No dia 30 de julho, segunda-feira, o deputado federal e pré-candidato à presidência do Brasil Jair Bolsonaro (PSL-RJ) participou do programa de entrevistas do Canal Cultura, o Roda Viva. O programa é conhecido por sabatinar candidatos, políticos e celebridades sobre assuntos polêmicos. Uma bancada de jornalistas de variados veículos de comunicação brasileira aborda diversos temas, com direito a discussões e tréplicas.

Bolsonaro mostrou ignorância no que se refere à história, economia, saúde e outros temas. Perguntado sobre vacinação e o aumento da taxa de mortalidade infantil, discursou sobre pré-natal e saúde bucal. E falou também de impostos, responsabilizando tais itens ao aumento da taxa. Lembrando: o assunto era vacinação.  

Num outro momento, o capitão da reserva afirmou que “os portugueses nem entraram na África”, os negros que vendiam outros negros como escravizados. E, como ele não escravizou ninguém, não tem dívida nenhuma com a população negra. Tendo imunidade parlamentar, disse poder falar o que quiser, se referindo ao episódio em que critica uma comunidade quilombola.

Quando questionado sobre ser machista e homofóbico, Bolsonaro disse que nunca falou que uma mulher deveria ganhar menos, nem é contra a comunidade LGBTQ+, mas “o pai não pode chegar em casa e ver o Joãozinho brincando de boneca por influência da escola”. Ele falou ainda que não é contra gay, e sim contra o “kitgay” nas escolas.

Questionado sobre o número de projetos apresentados como deputado federal, o candidato falou em 500, sendo corrigido imediatamente: são apenas 172. Bolsonaro disse apenas “que seja”. Esse foi um dos raros momentos em que alguém da bancada o questionou e o corrigiu, mas não seguiu o questionamento, observada a discrepância dos números.

O espantoso não foram as respostas pífias de Bolsonaro, já esperadas, mas sim a falta de questionamento por parte dos entrevistadores. Como países africanos falam português se os portugueses nunca pisaram lá? Dá para ignorar como eram e de quem eram os navios negreiros – e quem se enriqueceu com esse comércio? Imunidade parlamentar autoriza racismo? Não há uma exclusão da população negra hoje, consequência do escravagismo do passado, a ser enfrentada? Não foi Bolsonaro que, em participação no programa Super Pop, disse que, se fosse empresário, pagaria menos para uma mulher do que para um homem? Não foi ele que, “não tendo nada contra gays”, disse que o pai bater torna o filho hétero, como se isso funcionasse e fosse o certo a ser feito?

Ao não questionar e não refutar o que o Bolsonaro fala, entrevistadores reforçam o discurso violento, demagógico e falacioso dele. Ele inventa números, ignora fatos históricos, recua quando é  conveniente, e há quem o aplauda.

O Roda Viva perdeu a sensibilidade para questionar, debater e corrigir o sabatinado. A entrevista chapa-branca de Michel Temer, a entrevista homenagem de Sérgio Moro, e a vergonhosa sequência de interrupções a Manuela d’Ávila são exemplos de como o programa se tornou uma plataforma ideológica de entrevistadores que não conseguem fazer o básico: questionar para escutar e escutar para questionar. Com o perdão do trocadilho, não é necessário inventar a roda para retomar a proposta original.

 

Paulo Basilio

Mestrando do PPGCOM-PUCMinas



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