Análise | Poder e Política

A PEC segue em frente; o debate, não

A velocidade da tramitação da Reforma da Previdência revela a disponibilidade dos congressistas em acatar o texto proposto pelo governo de Jair Bolsonaro; no entanto, os esforços para incluir a participação massiva na discussão caminham em uma velocidade bem diferente.
Sessão no plenário da Câmara dos Deputados que conclui votação em primeiro turno da Reforma da Previdência. Crédito: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

O rápido avanço da Proposta de Emenda à Constituição 06/2019, conhecida como Reforma da Previdência, comprova mais uma vez a disponibilidade de nossos congressistas em abraçar o texto elaborado pelo governo Jair Bolsonaro (PSL). Após aprovação na Câmara dos Deputados, o projeto tramita pelo Senado Federal, onde uma série de audiências públicas com especialistas já debateu os prós e os contras da lei.

Caso os senadores alterem a PEC, ela volta para a Câmara. Ao ser aprovada pelas duas casas, é sancionada no próprio Congresso. Se depender da pressa do governo federal, que buscou “agradar” nossos legisladores com a liberação de cifras bilionárias, e da disponibilidade da maioria dos parlamentares, isso deve ocorrer muito em breve.

Poucos de nós ficamos sabendo das tais audiências públicas. A participação nessas discussões é uma realidade ainda mais remota. E esta é apenas uma faceta do distanciamento existente entre a sociedade e toda a engrenagem que gira em torno da corrida pela aprovação da PEC.

A complexidade da tramitação (e do próprio texto da PEC em si) permite que o assunto seja pouco familiar para grande parte da população. Por mais que a Reforma ocupe uma fatia considerável do noticiário há meses e que o assunto esteja na pauta da conversação cotidiana, inclusive online, a temática não deixa de ser espinhosa. Regras de transição, privilégios, idade mínima, tempo de contribuição – a seguridade social é de interesse de praticamente todos os brasileiros, porém, precariamente assimilada por seus próprios beneficiários.

Tornar um discurso pouco acessível, como ocorre com o político e o econômico, é uma estratégia de controle. No lugar de esclarecer e tornar mais didáticos assuntos tão centrais, a semântica predominantemente utilizada pelos congressistas e pelo governo federal é de que a Reforma irá sanar todos os problemas econômicos do país. Sem esclarecer exatamente o porquê. Sem insistir na explicação do que seja dívida pública, décifit, superávit primário, etc.

Tais explanações também são esporádicas nos relatos jornalísticos. O esforço do noticiário está muito mais em descrever o passo a passo da PEC do que adotar uma postura educativa (e cívica) para com seu público – com exceções, é claro.

A seguridade social diz respeito aos interesses de uma coletividade que deve ser, na medida do possível, plenamente capaz de opinar sobre ela. Os meios de comunicação social, enquanto reverberadores de sentidos, têm o dever cidadão de se esforçar para que esse quadro se consolide. Dos políticos, infelizmente, pouco se pode esperar por ora. Enfraquecer ou dificultar o acesso a um espaço público de argumentação ressalta a falta de um projeto em comum que transcenda aos interesses individuais ou grupais no Brasil. A PEC avança no circuito político e nós, sem entendermos exatamente o que isso significa, paralisamos. Mas há saídas. É nas resistências contingenciais que se encontra a esperança para uma união de forças que discuta com mais afinco esta e outras possíveis reformas – e que, além do discurso, parta para uma ação em prol de um social verdadeiramente democrático.

Raquel Dornelas Doutoranda em Comunicação Social – UERJ



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