O texto aborda a acirrada disputa eleitoral nos Estados Unidos, em um contexto de recrudescimento da pandemia de Covid-19, protestos contra o racismo e a violência policial.
O contexto norte-americano que antecede as eleições é muito preocupante. O número de casos de Covid-19 cresce na maioria dos estados e se mantém em patamar elevado nos demais. O país já contabiliza mais de 8 milhões de infectados pelo novo coronavírus e mais de 220 mil vidas perdidas. Nos últimos dias, o país voltou a registrar mais de 50 mil novos casos diários da doença.
Enquanto isso, a disputa presidencial é cercada de agressões e até ameaças. O primeiro debate realizado entre os presidenciáveis foi definido como um caos por grande parte da imprensa. Trump tentava desviar a atenção da revelação recente de que pagou quase nada de impostos em 2016 e 2017, interrompia Biden e até o moderador do debate, Chris Wallace, desrespeitando as regras do jogo democrático. Biden respondeu à agressividade do republicano: disse que ele era o pior presidente da história dos EUA, que falhou em enfrentar a pandemia e cobrou dele uma condenação aos supremacistas brancos – o que foi recusado por Trump. Este insistiu, mais uma vez, na teoria conspiratória de que haverá fraude nas eleições e disse que não aceitará a derrota.
Dias depois do debate, Trump foi diagnosticado com Covid-19 e internado em um hospital militar, onde recebeu medicamentos usados em casos mais graves da doença. Mas nem a infecção fez o republicano mudar a postura diante da pandemia: fez uma aparição sem máscara nas redondezas do hospital, voltou para a Casa Branca dias depois, colocando em risco funcionários da residência, fez discurso defendendo a necessidade de ter “coragem” para enfrentar o vírus e voltou a fazer comícios, promovendo aglomeração de simpatizantes (que não costumam usar máscara nem são adeptos do distanciamento social, tal como o presidente).
Biden, por sua vez, procura dar o exemplo no protocolo de segurança para combater a difusão do novo coronavírus. Usa máscara, mantém distanciamento e faz comícios diante das pessoas em seus carros. A seu favor, conta com a parceria da senadora Kamala Harris como candidata a vice-presidente na chapa democrata. Harris é a primeira mulher negra a integrar uma chapa presidencial de um dos grandes partidos dos EUA, em um contexto marcado por protestos contra o racismo e a violência policial no país. Filha de imigrantes (mãe indiana e pai jamaicano), Kamala pode ajudar a conquistar o voto de mulheres, negras e imigrantes para os democratas. A misoginia de Trump, que a chamou de “monstro” e “comunista”, pode ajudar a conquistar o voto feminino para Biden.
A chapa democrata acumula cerca de dez pontos de vantagem nas últimas pesquisas no voto direto e também em estados importantes do Colégio Eleitoral – que configuram o voto decisivo nas eleições americanas. O candidato precisa obter no mínimo 270 votos dos 580 delegados para ser o novo ocupante da Casa Branca. Trump ou Biden, o novo presidente precisará enfrentar o recrudescimento da pandemia da Covid-19 e outros tantos desafios do contexto norte-americano.
Paula Simões, professora do PPGCOM/UFMG. Pesquisadora do GRIS