Análise | Poder e Política

Em tese, a vez do governador

Às 13h36 do dia 31 de agosto de 2016, o Senado cassou o mandato de Dilma Rousseff. Quatro horas e 42 minutos depois, Fernando Pimentel, governador de Minas Gerais e amigo da ex-presidenta, se colocando como “cidadão brasileiro”, manifestou, por meio de publicação no Facebook, sua “indignação e repúdio” ao acontecimento. Quase um ano e oito meses depois de lamentar a aprovação do impeachment da correligionária, é o próprio Pimentel que agora passa a sofrer ameaça semelhante. Por ironia do destino – e por imposição do jogo político – o acontecimento reverberante que motivou a aceitação de um processo que pode levar à interrupção do mandato do governador tem relação direta justamente com a ex-presidenta Dilma.

Governador Fernando Pimentel se reúne em 2015 com a então presidenta Dilma. Foto: Manoel Marques/Imprensa-MG.

Nascida em Belo Horizonte, mas com carreira política construída em Porto Alegre, Dilma Rousseff trocou o domicilio eleitoral do Rio Grande do Sul para Minas Gerais no último dia permitido pela legislação, em 06 de abril. O fato foi resultado de tratativas que tiveram o apoio do ex-presidente Lula para que Dilma se aproveite do capital de votos que conquistou em Minas na última eleição presidencial, quando venceu no Estado com 52,41%, e se lance ao Senado nas eleições de outubro. A estratégia, no entanto, desagradou o presidente da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o deputado Adalclever Lopes (MDB) e o seu grupo político. Adalclever, que também é um dos postulantes a uma vaga no Senado, viu diminuir as chances de ser eleito com a entrada da amiga de Pimentel na disputa. Ele teria se sentido desprestigiado. O deputado dava sustentação política ao governador que, desde meados de 2016, rompeu com o vice-governador Antônio Andrade, presidente do partido de Adalclever. Com o rompimento, o MDB se dividiu e, com o apoio do grupo de Adalclever na Assembleia em Minas, Pimentel pôde continuar o mandato. Mas agora tudo parece ter mudado.

Ao aceitar que o processo de impeachment contra o governador passe a tramitar, o presidente da Assembleia alega ver indícios de que, ao reter e restringir repasses orçamentários aos poderes judiciário e legislativo, os chamados duodécimos, Pimentel cometeu crime de responsabilidade. O pedido foi protocolado pelo advogado criminalista Mariel Marra. O governador defende que a denúncia é “inconsistente e sem sustentação jurídica”.

Sem conseguir formar maioria na Assembleia Legislativa apenas com os nove deputados eleitos pelo Partido dos Trabalhadores, Pimentel precisou fazer alianças para governar, como é típico da política. Em tese, o governador conta com o apoio de uma maioria formada por 33 deputados de sete diferentes legendas, enquanto 21 deputados de cinco outros partidos formam um bloco que faz oposição ao governador. Há ainda outros 23 deputados de nove diferentes legendas formando um terceiro bloco que, também em tese, são independentes.

Aparentemente, Pimentel tem boas condições de barrar a denúncia. O governador precisa que 1/3 ou 26 dos 77 deputados rejeitem a continuidade do processo. Ou seja, pouco importa se a acusação carece de sustentação jurídica, como defende o acusado. Pimentel vai precisar mostrar mesmo é sustentação política. Caso isso não ocorra, o governador é temporariamente suspenso e o mérito passa a ser julgado por uma comissão de desembargadores do Tribunal de Justiça de Minas gerias (TJMG) e deputados da ALMG.

Refém de um sistema de coalização de partidos para governar, o mesmo que parece ter derrubado Dilma Rousseff, Pimentel vivencia experiência semelhante ao que aconteceu em 2016 com a sua amiga de longa data – os dois lutaram juntos contra a Ditadura Militar. Para não ter o mesmo fim político da companheira, o governador precisará provar que tem maior habilidade que Dilma para manter unida a base de apoio que construiu, em meio a esse perverso (porém legalmente estruturado) sistema, do qual alguns legisladores se aproveitam para desestabilizar governos e impedir reais avanços. Se conseguir, Pimentel não só conclui o mandato como, inegavelmente, ganha forças para manter e negociar apoios durante as eleições de outubro. Como se vê, será dessa habilidade – ou da falta dela – que serão concebidos os próximos acontecimentos de parte da política em Minas. Ao falhar, Pimentel abre caminho para que a oposição retorne ao poder. Ao barrar o impeachment, transforma um acontecimento negativo em fato positivo, cresce a chance de ser reeleito e, por imposição do jogo político, quem diria, ainda favorece, sim, ela mesma: Dilma Rousseff.

Pablo Nogueira
Mestrando em Comunicação Social pela UFMG e jornalista do Centro de Comunicação da UFMG



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