A greve dos caminhoneiros já é uma ocorrência marcante na recente história de um país em convulsão. Em virtude dos impactos sociais, políticos e econômicos, ganhou contornos de uma grave crise com consequências que, possivelmente, se farão presentes por um longo período no País. Em meio ao acontecimento, a mobilização de atores políticos e econômicos, revelou, através de discursos limitados, que muitos deles ainda parecem desconhecer a realidade do Brasil que governam.
O aumento do preço do óleo diesel – principal controvérsia que mobilizou os caminhoneiros – é resultado da decisão do governo brasileiro de dar autonomia para a Petrobras adotar uma política de variação de preços para os combustíveis, atrelada às oscilações constantes do mercado externo. Era de se esperar que acontecimentos no cenário global tivessem efeitos sobre o preço do petróleo e, por consequência, também no Brasil. E não faltaram, sobretudo nos últimos meses, fatores internacionais influentes. Os Estados Unidos elevaram a sua taxa de juros, o que atraiu investidores e ajudou a valorizar a moeda americana – o preço do barril é negociado em dólar. Os governos iraniano e estadunidense cancelaram o acordo nuclear, gerando uma crise diplomática que ameaça negócios envolvendo o petróleo entre as duas nações. E o presidente Donald Trump impôs uma série de sanções econômicas à Venezuela, país que vende 1/3 do seu petróleo aos EUA. Todos esses acontecimentos acabaram por forçar sucessivos aumentos no preço dos combustíveis em todo o mundo.
No Brasil, a maioria dos atores políticos, econômicos e também midiáticos – alinhados ao governo e à oposição – consentiu nessas razões econômicas, embora alguns tenham associado esses aumentos a outras questões como, por exemplo, à corrupção.
No entanto, é no rumo a tomar diante da crise desencadeada pela greve dos caminhoneiros, que a divergência começa. O caminho apontado por grupos de esquerda é que o governo passe a interferir na política de cobrança da Petrobras, regulando o valor dos combustíveis, como fez Dilma Rousseff. A ex-presidenta é acusada pelos adversários de ter cedido a uma política populista, ao controlar artificialmente os preços antes das eleições e, com isso, ter prejudicado o desenvolvimento do país. Do contrário, a solução apontada por grupos de direita é manter a política atual, continuando a inserir o Brasil na lógica de um mercado livre e global, como fez Michel Temer. Temer é acusado pelos adversários de privilegiar os lucros dos investidores internacionais e penalizar os trabalhadores brasileiros, deixando que os preços sejam controlados pelo mercado e, com isso, prejudicando o desenvolvimento do País.
São plausíveis os argumentos, embora seja difícil, mas necessário unir o melhor de ambos os lados. Caso o contrário, os discursos continuarão a ignorar justamente os públicos que procuram mobilizar. Governistas e oposicionistas, ao se dirigir aos brasileiros, tentam encaixar o Brasil contemporâneo em idealizações pré-estabelecidas, soando muito distantes do que hoje se passa. Pouco adianta que uma economia se preze, a qualquer custo, pela lei de Estado, se os brasileiros vivem em um país inserido na ordem internacional liberalizante e são, inevitavelmente e cada vez mais, influenciados pelas decisões de meio mundo – a relação comercial entre Brasil e outros países, por exemplo, movimentou US$128 bilhões [1] até abril de 2018. Mas de que serve uma economia refém de agentes do mercado se falta há muitos brasileiros justamente renda para ir às compras? Mais da metade da população ganha menos de um salário mínimo [2]. Ao empreender um debate de “guerra fria” em pleno século XXI, atores da 9ª economia global [3] e 10ª mais desigual [4] , revelam que, impedidos de ver por suas ideologias, conhecimentos limitados ou más intenções, contribuem pouco para o Brasil. Sem um desejável equilíbrio, adotam uma espécie de viseira e passam a enxergar a fotografia de um país distante da vida dos brasileiros.
Pablo Nogueira
Mestrando em Comunicação Social pela UFMG e jornalista do Centro de Comunicação da UFMG