Análise | Diário da Quarentena Poder e Política

O que está acima de tudo e de todos é Bolsonaro

Nem mesmo o isolamento social tem sido capaz de frear os bolsonaristas. Sua fidelidade, que claramente não tem nada a ver com o Brasil e sim com o presidente, desafia orientações dos órgãos de saúde e até mesmo a Constituição brasileira.

Bolsonaro no protesto de 19 de abril. Foto: Ueslei Marcelino / Reuters

Os últimos domingos foram marcados por carreatas em várias cidades brasileiras. A primeira, no dia 19 de abril, para comemorar o dia do Exército Brasileiro, reuniu algumas dezenas de pessoas em frente a quartéis generais. Entre os cartazes, pedidos de intervenção militar, retorno do AI-5, fechamento do Congresso e do Senado — todas, reivindicações que ferem a Constituição Brasileira. Já o segundo ato, em 26 de abril, além de manter o pedido do fim do isolamento social, também buscou demostrar apoio ao presidente após a saída de Sérgio Moro do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Mantendo a tradição dos domingos bombásticos, também no dia 3 de maio, Bolsonaro acompanhou manifestação de apoiadores em frente do Palácio do Planalto, contra o STF e Congresso.

Apesar de as manifestações do dia 19 irem contra recomendações de órgãos de saúde e ferirem princípios democráticos, Bolsonaro não só compareceu ao ato em Brasília, como discursou aos manifestantes, provocando ainda mais aglomeração. Usando frases de efeito como: “não queremos negociar nada”; “acabou a época da patifaria”, o presidente expressou seu apoio aos manifestantes, não demostrando qualquer reprovação aos seus pedidos antidemocráticos: “Eu estou aqui porque acredito em vocês. Vocês estão aqui porque acreditam no Brasil.”

A presença do presidente no ato e suas reivindicações provocaram o repúdio de governadores, políticos e entidades. Além disso, o STF autorizou a abertura de inquérito para investigar quem organizou e financiou os atos em defesa da intervenção militar.

As investigações, no entanto, a princípio, não envolvem a figura de Bolsonaro e não intimidaram bolsonaristas e nem o presidente, que voltou a se reunir com os manifestantes no dia 03 de maio. Bolsonaro afirmou que as Forças Armadas estão ao lado do povo e que não irá mais aceitar interferências em seu governo.  O protesto, que aconteceu no dia mundial da liberdade de Imprensa, também foi marcado por agressões físicas à equipe do jornal “O Estado de São Paulo”, uma consequência do desrespeito do próprio presidente a alguns jornalistas e veículos de imprensa.

Diante deste acontecimento, mais uma vez fica claro, que a maior preocupação de Bolsonaro não é com bem-estar do tão aclamado “povo brasileiro” e sim com a adesão de seus apoiadores. Seus atos e falas se dirigem a seus eleitores e servem para incentivá-los e engajá-los no bolsonarismo. As manifestações, embora esvaziadas, provam que o presidente tem conseguido sustentar seu apoio popular. Pesquisa do Data Folha aponta que Bolsonaro mantem aprovação de 33% da população. Ainda que pareça pouco, é o apoio desse um terço um dos elementos que impede, por exemplo, que os vários pedidos de impeachment do presidente se tornem uma questão política viável.

Outro aliado de Bolsonaro — por mais combatido que seja por ele — é o isolamento social.  Sem poder ir às ruas, devido à gravidade da pandemia, os opositores do governo manifestam sua indignação de forma desorganizada, seja nas redes sociais ou batendo panelas das sacadas. Enquanto isso, os bolsonaristas, inflados pelo discurso de que a “gripezinha” não tem nada de grave, fortalecem sua militância e saem às ruas, colocando em risco sua saúde e a dos outros. Com a desculpa e quem sabe até a ilusão de que estão representando a vontade do povo brasileiro ou que estão “dando a vida pela pátria”, eles se arriscam, no fim das contas, não pelo país, mas para manter seu “mito” no poder.

Fabíola Souza, professora da UFOP e pesquisadora do Gris



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