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A prisão de Michel Temer e o jogo político das instituições

A prisão do ex-presidente Michel Temer e de mais nove acusados de participar de um esquema de corrupção nos mostra, mais uma vez, o uso indevido da justiça como instrumento de disputas políticas e pesado jogo entre atores e instituições.

Imagem: Reprodução/TV Globo

O ex-presidente Michel Temer foi preso pela força tarefa da Lava Jato, no dia 21/03/2019, sob acusação de liderar uma organização responsável por crimes de corrupção, peculato e lavagem de dinheiro. Dez mandados de prisão foram cumpridos pela Polícia Federal, a pedido do juiz Marcelo Bretas, responsável por processos da Lava Jato no Rio de Janeiro. Entre os presos também estavam o ex-ministro Moreira Franco, aliado de Temer e sogro do presidente da Câmara Federal, deputado Rodrigo Maia (DEM/RJ),  e o coronel João Batista Lima Filho, amigo de Temer e suspeito de ser um de seus intermediários para recebimento de propina. Temer permaneceu em prisão preventiva na Superintendência da Polícia Federal do Rio de Janeiro por quatro dias até ser libertado, junto com outros sete acusados, por uma liminar do desembargador federal Ivan Athié.

Uma primeira possibilidade de interpretação deste acontecimento remete à já conhecida espetacularização midiática das ações da Lava Jato, resultante da estreita relação entre agentes desta operação e das mídias. Com a  antecipação da informação para a imprensa e a presença de jornalistas na porta da casa antes mesmo de a polícia chegar, o circo midiático da Lava-Jato estava novamente montado, enquanto policiais armados com fuzis levavam o ex-presidente. A detenção do coronel Batista Lima foi televisionada ao vivo pela Globo News. Já a de Moreira Franco foi filmada pelos próprios policiais e divulgada na internet horas depois. A ampla espetacularização das prisões alimenta o apelo popular do combate à corrupção, sustenta a estratégia da Lava Jato de manter sua atuação no centro dos holofotes, de mostrar que faz trabalho relevante e que não possui motivações políticas, alcançando figuras públicas de diferentes partidos.

O assunto mais popular do dia no Twitter trazia referências à caricatura vampiresca de Temer, piadas envolvendo sua esposa Marcela (algumas bastante machistas) e muitas imagens descontextualizadas da ex-presidenta Dilma Rousseff em momentos de risada e descontração, como se estivesse comemorando. No entanto, a própria Dilma questionou  os motivos da prisão.  Enquanto alguns comemoraram, outros contestaram. Juristas e até críticos e adversários políticos questionaram os abusos da Lava Jato, a legalidade do mandado expedido pelo juiz  Bretas e as circunstâncias da prisão.

Outros sentidos podem ser associados à prisão de Temer se a relacionamos ao contexto e a outros acontecimentos em curso no momento de sua ocorrência.  A prisão foi interpretada como consequência de um embate político entre STF e Lava Jato, que resultou, dias antes, em derrotas significativas para a operação. Uma delas foi a decisão do STF de que a Justiça Eleitoral é a responsável pelo julgamento de casos de caixa 2, o que provocou a indignação de agentes da Lava Jato. A outra foi o forte questionamento público, inclusive por parte de integrantes do STF, como Gilmar Mendes, sobre a tentativa dos  procuradores da Lava Jato de criar e administrar um  fundo bilionário com dinheiro de multas pagas pela Petrobrás, o qual está sendo investigado pela PGR. A prisão de Temer e especialmente a de Moreira Franco também parece ser do interesse do acuado ministro Sérgio Moro, que se desentendeu às vésperas com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Para além do espetáculo, da ilegalidade e da banalização de prisões promovida pela Lava Jato, que fragilizam cada vez mais o próprio judiciário, a detenção de Temer permite ver, portanto, motivações, interesses e o jogo de forças que tem impulsionado a ação de atores e instituições, bem como o quanto a justiça vem sendo por eles utilizada como instrumento para disputas por protagonismos e espaços de poder.

Terezinha Silva
Professora do Departamento de Jornalismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Maria Helena de Pinho
Estudante de Graduação em Jornalismo pela Universidade Federal de Santa Catarina, bolsista de Iniciação Científica/CNPq.



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