Falar sobre Amor e Sexo na Globo parece ser uma tarefa menos difícil de uns tempos para cá. Em 2009, quando o programa estreou, Fernanda Lima tinha pouco mais de 20 minutos para tentar conversar com a audiência morna advinda do Globo Repórter – sexta-feira, após as 23h. O cantor Léo Jaime comandava a banda e o programa exibia reportagens feitas pelo casal Fábio e Valéria, de 78 e 69 anos (respectivamente), juntos há mais de 50. A segunda temporada foi ao ar dois anos depois, em 2011. Dessa vez, exibida às terças-feiras, após o paredão do BBB. Quadros como o Gayme (uma gincana com homens homossexuais que disputavam um cruzeiro com um acompanhante), e o Ponto G (a apresentadora verificava nas ruas o entendimento sobre alguns termos específicos, como, por exemplo, cunilíngua) foram criados para o novo formato da atração. O conteúdo foi aperfeiçoado aos poucos. Depois de cinco temporadas, o programa edificou um posicionamento que parecia mais jovem, moderno e, principalmente, mais disposto a enfrentar alguns temas compreendidos como tabus.
Na sétima temporada (2013), Fernanda Lima inovou com performances nas aberturas dos episódios, cantando e dançando, e também começou a atuar como redatora. O primeiro programa foi polêmico. Para abordar o tema nudez, ela interpretou a música Folia no Matagal, junto com dez pessoas nuas no palco. A atração já apresentava uma estrutura fixa, que contava com a bancada e alguns jurados que se mantém até hoje. A diferença é que agora parece haver um interesse mais explícito em exibir um posicionamento “engajado” a partir de temas que convocam minorias, e que se relacionam com amor e especialmente com sexo.
Leo Jaime foi substituído pela performer e drag queen Pabllo Vittar e as antigas reportagens já não cabem mais. Na temporada que começou este ano, o programa tem chamado a atenção pelos temas e pelas abordagens – feminismo, machismo e orgulho LGBT foram os assuntos que marcaram a reestreia da atração. Em todos os casos, os convidados foram destaque e renderam diversas manifestações nas redes sociais. Muita gente aprovou o discurso politizado, mas muitos também questionaram a autenticidade do engajamento por parte da emissora.
Certamente não dá para esperar que um programa de entretenimento de fim de noite, da Globo, aborde questões políticas com muita profundidade e comprometimento com tensões sociais. Ao mesmo tempo em que discute conteúdos fundamentais, como a violência contra a mulher e a legalidade de gêneros, entre uma piada e um número de dança Fernanda Lima também distribui dinheiro, no melhor estilo Silvio Santos, para os participantes da plateia que vão ao microfone, no quadro sexo oral.
O interesse por esses temas não é exclusividade do programa. É possível perceber a recente inserção volumosa de assuntos como o feminismo e a discussão sobre gêneros em produtos culturais variados – da publicidade, do cinema, da música. A Globo, nesse sentido, parece ter assumido uma postura mais incisiva com relação à sexualidade, inclusive no jornalismo (o quadro Quem sou eu?, do Fantástico, sobre pessoas trans, ressalta a questão). Ao adotar esse posicionamento, a emissora também ajusta sua relação com parte da audiência, que não aceita o tratamento dado ao tema: talvez pelo fato de estar renunciando a um nicho importante do público (por apostar em outros), ou talvez porque, na verdade, esse nicho já tenha migrado para a concorrência.
De toda forma, aparentemente, falar sobre isso está em alta e, portanto, empresas desejam explicitar posicionamentos político-sociais na intenção de conquistar cada vez mais consumidores “engajados”. Parece pouco autêntico e muito oportunista. Mas, ao mesmo tempo, não há como negar que, para além da razão, o programa tem tocado na emoção da gente. Tanto pelas apresentações de Elza Soares, Liniker e Ney Matogrosso, quanto pelas representações diversificadas que, cada vez mais, se afirmam social e midiaticamente.
Fernanda Medeiros
Doutoranda do PPGCOM-UFMG
Pesquisadora do GRIS