Análise | Poder e Política

CPMI das Fake News: o “gabinete do ódio” e o ódio entre ex-aliados

No lugar de resultados contundentes emedidas para conter os responsáveis, a CPMI das Fake News repercutiu mais como palco de bate-boca entre bolsonaristas e ex-bolsonaristas. As denúncias da deputada Joice Hasselmann (PSL-SP) não foram contestadas com argumentos, mas deram lugar a ofensas e troca de acusações entre membros do grupo que, até pouco tempo, compartilhava do mesmo esquema de desinformação e disseminação de mentiras.

Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Um power point. Acusações pesadas ao presidente da República. Revelações feitas mais para gerar visibilidade midiática para o denunciante do que em prol do bem coletivo. Não, não estamos relembrando o episódio envolvendo o procurador Deltan Dallagnol e o ex-presidente Lula. Dessa vez, as farpas contra o Executivo partiram de uma ex-aliada: a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), recentemente rompida com o clã Bolsonaro.

Joice era um dos nomes mais esperados na CPMI das Fake News, que investiga um suposto esquema de disseminação em massa de notícias falsas nas eleições de 2018. Em seu depoimento, a deputada afirmou que existe um “gabinete do ódio” dentro dos corredores do Planalto, e que os filhos de Bolsonaro comandariam um exército online financiado com dinheiro público. Para confirmar a denúncia, a parlamentar fez uso de slides que detalhavam o esquema denominado por ela de “milícia digital”.

Mas, para além das denúncias, o que chamou a atenção foi o tom do debate: a CPMI se transformou em um verdadeiro circo. Amigas íntimas de outrora, Hasselmann e Carla Zambelli (PSL-SP), que ainda permanece ao lado de Bolsonaro, aproveitaram os holofotes e lavaram roupa suja ao vivo. Das fake news, a pauta se deslocou para a troca de ofensas pessoais. Zambelli, a ex-parceira, agora era psicopata, abortista e burra. O baixo nível do debate ultrapassou as paredes do Congresso. Sobre a participação de Halssemann na CPMI, Jair Bolsonaro chamou a sua ex-braço direito de “idiota”. Em meio a tudo isso, o deputado federal Filipe Barros (PSL-PR) afirmou que o livro de Joice era plágio e veiculou um áudio no qual a parlamentar utiliza palavrões para se referir ao mundo da política. Como se não bastasse, Alexandre Frota (PSDB-SP), que já deixou o PSL, levou um bolo para comemorar um ano em que o caso Queiroz veio a público.

Quebras radicais de alianças outrora “tão sólidas” mostram a falta de um projeto coeso por parte do corpo político que orbita em torno do líder do Executivo. Percebendo o naufrágio do PSL, o presidente tratou logo de pular do barco. Eduardo Bolsonaro voltou a comandar a legenda na Câmara, minando mais forças da ex-líder Hasselmann. Agora, cada um corre para garantir o seu bote salva-vidas, mesmo que, para isso, seja necessário colocar ex-amigos na forca.

A CPMI poderia ser um potente espaço para investigar o escandaloso esquema atribuído a Bolsonaro. Porém, não se pode negar a dificuldade de desarticular um arranjo tão complexo – o que demandaria ajuda especializada e alta tecnologia para alcançar e desmantelar a milícia digital. Tarefa árdua, mas não impossível. No entanto, quando nos deparamos com o comportamento de suas excelências, que utilizam espaços de debates e a mídia como vitrines para autopromoção e desqualificação de desafetos, a solução parece ficar mais distante. Enquanto isso, os robôs seguem trabalhando. A mando de quem e com qual intenção? Dessa vez, há convicções e provas. O que estaria faltando, portanto, para a queda dos verdadeiros criminosos?

Vera França, Professora titular de Comunicação Social da UFMG e coordenadora do GrisLab
Raquel Dornelas, Doutoranda em Comunicação pela UERJ



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