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Das redes sociais digitais às ruas: o protagonismo das mulheres no movimento #EleNão

O texto aborda os  protestos históricos realizados no Brasil e no mundo no dia 29 de setembro, destacando o papel deles na construção da democracia e na consolidação do feminismo.

Fotografia por Bárbara Ferreira

29 de setembro de 2018. Milhares de manifestantes foram às ruas de diversas cidades do Brasil e do mundo ecoar o grito #EleNão. Os protestos foram convocados nas redes sociais digitais, sobretudo, a partir da página do grupo no Facebook Mulheres Unidas contra Bolsonaro (MUCB), que conta hoje com quase quatro milhões de integrantes. Criado pela publicitária Ludmilla Teixeira, o grupo reúne mulheres de perspectivas ideológicas distintas que têm em comum a rejeição à candidatura de Jair Bolsonaro (PSL) à presidência do Brasil. Elas se posicionam contra o machismo, a misoginia, o racismo, a homofobia, a violência, a defesa da tortura e da ditadura militar que emergem de ações e falas desse candidato – amplamente difundidas na Internet. Refletindo sobre os sentidos instaurados por esse acontecimento, dois pontos parecem centrais.

Em primeiro lugar, é preciso destacar a potência de uma sociedade democrática. Mulheres e homens, pessoas LGBTQIAP+, crianças, jovens e idosos se reuniram para marcar um posicionamento não em defesa de um candidato, mas em repúdio ao que Bolsonaro representa. A liberdade de expressão e manifestação é fundamental em uma democracia. Como destacou a pesquisadora Céli Pinto, “#EleNão virou um significante cheio de significados. Isso é muito importante na luta política. Começou pelas mulheres, porque Bolsonaro disse frases de baixo nível em relação a mulher, e foi englobando muita coisa, como a defesa da democracia e dos direitos humanos”. Vale lembrar que o grupo enfrentou ameaças: a página do Facebook foi hackeada por apoiadores do candidato, uma das administradoras foi agredida fisicamente no Rio de Janeiro, além de outras ameaças que circularam na Internet (como a divulgada pelo vereador Carlos Bolsonaro, que faz apologia à tortura e será apurada na Comissão de Ética da Câmara do Rio). Vivemos em uma democracia que vem sendo ameaçada – e essa é, justamente, uma das pautas centrais do movimento.

Em segundo lugar, o acontecimento aponta para o protagonismo das mulheres tanto nas eleições de 2018 como na cena social contemporânea mais ampla. Ainda que o movimento tenha sido ampliado, foram as mulheres que o iniciaram e o difundiram, convocando outros apoiadores. O movimento foi apontado como “a maior manifestação de mulheres da história do Brasil”. Como destacado por Céli Pinto, “O que aconteceu agora foi uma popularização do feminismo. Está espraiado na sociedade. Ninguém mais pode dizer que é contra os direitos das mulheres”. Nesse cenário, um candidato que não defenda a igualdade salarial entre homens e mulheres, que diz que uma mulher não merece ser estuprada porque é feia, que xinga mulheres de vagabunda e idiota, que afirma que ter uma filha mulher (depois de ter outros filhos homens) é uma “fraquejada”, enfim, um candidato que desrespeita as mulheres e não reconhece seus direitos encontra muita resistência. Como tão bem sintetizou Eliane Brum, Por que #EleNão? Porque #NósSim”. Nós, mulheres, de luta e resistência contra os preconceitos, contra o machismo e a misoginia, contra a violência e o autoritarismo, e a favor da democracia.

Paula Simões

Professora do PPGCOM/UFMG. Pesquisadora do GRIS.



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