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O programa é delas: feminismo e mulheres protagonistas no BBB20

Embora as mulheres sempre tenham participado dos pódios (muitas vezes conquistando o primeiro lugar), a edição do Big Brother desse ano carrega um protagonismo diferente desempenhado pelo time feminino da casa. A análise demonstra como esse é o resultado de uma organização consciente, que foi construída no início do programa e que ganhou o apoio do público.

Foto: reprodução/Globo

Como mencionado na análise anterior desse especial BBB20, logo na segunda semana de programa, cinco (dos nove) homens que estavam na casa planejaram um “teste de fidelidade”, que consistia em seduzir as famosas comprometidas, com a intenção de inferiorizá-las, prejudicando a imagem delas perante o público. Marcela e Gyselly, que escutaram o plano, se recusaram a fazer parte do esquema e, aos poucos, acabaram revelando para as outras integrantes os objetivos do time masculino.

Assim que souberam, as mulheres se uniram para confrontar os homens que, acuados, negaram o esquema e ainda disseram que as duas integrantes estavam mentindo. O público, acompanhando o comportamento dissimulado dos “brothers”, não perdoou e, no primeiro mês do programa, eliminou quatro homens em sequência. A blogueira conhecida como Boca Rosa, diferentemente de todas as outras companheiras de confinamento, decidiu se vincular ao discurso masculino e chegou a ironizar a união das “sisters”. Ela foi a única mulher eliminada até agora.

A partir de temas como machismo, assédio, relacionamento abusivo e o papel do homem na luta pelos direitos iguais, o BBB20 tem mobilizado não apenas as decisões dos paredões, mas também discussões importantes fora da casa. A pauta do feminismo ganhou visibilidade e diferentes reverberações no mundo real. O termo sororidade, por exemplo, teve um aumento de 250% de buscas no Google, após ser usado por Manu Gavassi como justificativa de voto.

Ao mesmo tempo, a abordagem sobre o feminismo também tem sido criticada por ser rasa e não abranger com profundidade todas as pautas de todos os feminismos. E há ainda quem diga que, enquanto o tema for debatido através de um programa de entretenimento espetacularizado, como o Big Brother, as reflexões mais consistentes (e acadêmicas) nunca chegarão ao grande público.

Em um país onde um terço das casas não tem acesso nenhum à internet, é importante lembrar como a tv aberta pode atuar como fonte de informação determinante e popularizar pautas que estão restritas ao debate de bolhas intelectuais. Ainda que seja rasa e óbvia para alguns, a discussão no BBB mostra, de antemão, como as mulheres estão em níveis diferentes de entendimento sobre o que é o feminismo. Mesmo assim, muitas (considerando inclusive pessoas da audiência) uniram forças em torno de uma organização genuinamente feminina. Nesse sentido, mesmo que não seja uma mulher a vencedora do programa, o protagonismo feminino já venceu uma estrutura masculina que nunca esteve em minoria tão contrastante dentro da dinâmica midiática do BBB. Isso não seria possível sem o apoio da audiência, ou da sociedade. Além disso, o programa tem escancarado diariamente como um certo feminismo – branco, cis e normativo – segue conformando outros problemas estruturais, como o racismo e as questões de classe.

De alguma maneira, essas pautas precisam extrapolar o conforto dos debates das redes sociais e avançar na coletividade, ainda que seja por meio do entretenimento da Globo. Como afirma bell hooks, “o feminismo é para todo mundo” e ele precisa chegar até as bases para que seja, de fato, pensado a partir da multiplicidade.

Fernanda Medeiros, Doutoranda em Comunicação Social pela UFMG



Comentários

  1. João Guilherme de Quevedo Almeida disse:

    Esta pauta envelheceu muito mal, há um consenso sobre a exclusão de pautas como feminismo negro dentro do BBB e o discurso elitizado do feminismo branco cisnormativo. Acho válido reavaliar esse artigo pesquisando sobre o tema no twitter por exemplo, de preferencia olhar na aba de pesquisa o termo “fadas senzalas”.

  2. Cristina Faria Medeiros disse:

    Abordagem perfeita! Conseguiu penetrar em cada alma feminina, que juntas sempre seremos mais fortes em qq situação! Nesse reality a Boca Rosa, que “optou” em não aderir, foi iliminada! Primeiro constatação que “isolada”, não somamos! E, queremos somar uma com as outras! Queremos o empoderamento real! Queremos ter a palavra honrada! O texto da doutoranda Fernanda Medeiros, mostra tudo isso com muita clareza! Parabéns! A semente já comecou a dar bons frutos! 🙏🌎🌎🌎👀👀👀

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