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Estratégias da Globo interrompem sua produção de novelas e programas de auditório

Desde o dia 16 de março, quando a Globo interrompeu as gravações de suas novelas e programas de auditório, sob a alegação de evitar o contato entre seus profissionais, atendendo ao alerta das autoridades de Saúde sobre os riscos de contágio pelo novo coronavírus, ficou um misto de aprovação e dúvida no ar. Afinal, nunca a história da televisão brasileira registrou uma atitude espontânea como essa.

Foto: reprodução / Rede Globo

Será que a Globo tomou essa decisão apenas por uma questão de saúde? Ao analisarmos pelo aspecto financeiro, podemos enxergar uma outra variável para essa pergunta. Um comercial de 30 segundos na emissora, em horário nobre (das 18h às 24 horas), pode custar até R$847.200,00 (segundo tabela da própria emissora). Um capítulo da novela das 21 horas, a produção mais cara da emissora, custa em torno de R$450 mil (o capítulo das outras novelas gira em torno de R$200 mil). Em média, cada capítulo no ar gera um faturamento de R$20 milhões.

Em 2018, o Grupo Globo, que inclui TV aberta, internet, TV por assinatura e mercado musical (fora os impressos) teve um faturamento consolidado de R$14.679 bilhões, sendo R$10.060 bilhões com publicidade e propaganda. Apesar da cifra, o grupo faturou R$123 milhões a menos do que em 2017, que já havia sido o pior ano da década — financeiramente falando. O resultado operacional de 2018 ficou negativo em R$530 milhões, prejuízo seis vezes maior do que os R$83,4 milhões negativos do ano anterior.

Apesar disso, no final das contas, o Grupo Globo fechou 2018 com um lucro líquido de R$1,204 bilhão (uma queda de 35% em relação ao resultado de 2017), graças aos juros de suas aplicações financeiras e à valorização do seu patrimônio. Segundo a edição do ranking BrandZ Brasil, realizada pela WPP e Kantar, a marca Globo em 2019 valia R$3,624 bilhões (16% a menos do que em 2018).

Mesmo oferecendo descontos e fazendo promoções em sua tabela de preços para anunciantes, o Grupo Globo vem sofrendo com a queda do mercado publicitário, agravada pelos efeitos da pandemia da Covid-19 na economia, o boicote de empresários de ultradireita, que acreditam que a emissora está sendo parcial no noticiário sobre o governo Bolsonaro, e com a perda de mais de dois milhões de assinantes de seus canais fechados.

Tentando buscar uma solução para a queda de faturamento, a holding continuou com sua política de redução de custos, que inclui cortes de salários (contratos de PJ passaram para CLT com reduções de mais de 50%), demissões em massa e diminuição no lançamento de novos produtos dentro da sua programação. Além disso, não faz mais distribuição de lucros aos seus sócios desde 2018. A aposta do Grupo Globo está toda concentrada no seu sistema streaming Globoplay, no qual irá investir R$1 bi só este ano.

Diante de tal situação, não só a estratégia de marketing para colher dividendos da venda da boa imagem da empresa, preocupada com a saúde de seus funcionários, mas a estratégia financeira de dar um tempo na produção de seus produtos mais caros, reduzindo drasticamente o custo, sem perder no faturamento de anunciantes em sua grade, parecem ser ótimos negócios.

Gilvan Araújo, Doutor em Comunicação, integrante do Gris e professor no Centro Universitário Promove/BH



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