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O caso Robinho: dissensos inesperados

Muito se fala da urgência do homem em admitir sua contribuição na permanência/combate à cultura do estupro. Mas o caso Robinho trouxe à tona a necessidade de as mulheres também desmoronarem as fortalezas que nos objetificam diariamente.

Carla Cecato e Cosme Rimoli no programa Fala Brasil. Foto: reprodução / Record

Em 2013, o jogador de futebol Robinho cometeu um crime de violência sexual contra uma jovem na Itália, onde jogava à época. O ato rendeu ao brasileiro uma condenação em 2017, só divulgada agora.

Na referida noite, o atleta alegou ter feito sexo oral com a garota (que estava embriagada) em comum acordo. Depois disso, teria ido embora, deixando a moça com colegas do mundo futebolístico. A gravidade, segundo a justiça italiana, estaria no fato de o jogador ter ciência da situação vulnerável da menina, cometer o abuso nessas condições e ainda abandoná-la junto aos amigos, conforme conversas divulgadas. “Estou rindo porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu. Olha, os caras estão na merda… Ainda bem que existe Deus […] Eram cinco em cima dela” (sic)

Com a repercussão, o contrato de Robinho, que voltaria a jogar no Santos para se aposentar, foi suspenso, devido à pressão dos patrocinadores.

Entre as inúmeras coberturas do fato, a apresentadora Carla Cecato, da Rede Record, direcionou um duro julgamento à jovem violentada na Europa. Na edição de 17 de outubro do telejornal Fala Brasil, ela se dirigiu ao comentarista Cosme Rimole, garantindo que a moça sabia do risco que corria por estar bêbada. “Como jornalista e como mulher, eu acho que eu tenho o direito de falar. […] Não estou tirando o teor da conversa, que é de baixo calão, de desrespeito contra a mulher. Ela estava embriagada […] existem muitos escândalos nos quais essas mulheres que vendem o próprio corpo também participam com anuência já sabendo do que vai acontecer existem né, Cosme? Vamos falar a verdade?” (sic)

Em contrapartida à tônica pré-julgadora de Carla, dois homens da mesma emissora reagiram de forma diferente. Cosme Rimole foi de encontro à fala da apresentadora, inclusive parafraseando-a em seu argumento. “Vou falar como jornalista e homem. Cabe ao jogador ter a decência de participar disso ou não. Quando o Robinho […] fala que a mulher estava embriagada, que não estava nem aí, ele teve uma postura péssima, ele que se entregou”.

Já Reinaldo Gottino, apresentador do Balanço Geral, foi enfático ao dizer que Robinho é condenado, ou seja, cometeu de fato um crime. “A jovem estava bêbada. Por isso mesmo, ela deveria ter recebido ajuda. Ela deveria ter sido protegida, e não ter sido tocada por um homem e seus amigos, homem que se esconde atrás da fama e usa o nome para cometer atos repugnantes […] Robinho tem que pagar pelo que ele fez”.

A cultura do estupro é uma realidade que nos rodeia. Mas é na manifestação surpreendente de dois homens que lampejos de esperança nos apanham e abrem para visões mais otimistas – especificamente quando tais lampejos são proferidos por quem sempre foi historicamente o lado dominador da história.

Raquel Dornelas, doutoranda em Comunicação Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), com financiamento Capes



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