“Papá! Mamá!”, chora uma criança latina separada dos pais por patrulheiros da fronteira dos Estados Unidos, em um centro de detenção no Arizona. Provavelmente, os pais ainda não puderam responder a seu choro, uma vez que estão presos, condenados pela doutrina de “tolerância zero” contra imigrantes, iniciada desde abril. Mas, graças a uma agente consular, o pranto abafado foi gravado e repassado para a agência de jornalismo ProPublica. Apesar de a criança permanecer sem colo, seu berreiro foi compartilhado por inúmeros veículos de todo o mundo. Quem escuta o áudio percebe que as vítimas do racismo desinibido do presidente dos EUA não são estupradores, traficantes ou “animais” nos termos de Trump. Longe de criminosos perigosos, são meninos e meninas, pequenos demais para cometer qualquer pecado. Trump já havia demonstrado ser irresponsável, corrupto, e, dispensando eufemismos, estúpido. Porém, na semana passada, ele mostrou ser simplesmente cruel.
Uma das primeiras crianças a ser identificada pela imprensa foi Alison Jimena, uma menina de seis anos de El Salvador. Sua família, assim como muitos outros pais, mães e filhos/as separados/as na fronteira, vieram aos Estados Unidos buscando escapar da violência de um país assolado por guerras entre gangues. Esses migrantes, a maioria da América Central, são refugiados, que deixam suas terras natais buscando asilo político nos EUA.
No entanto, foram recebidos com ordens de prisão. Devido à nova política, qualquer pessoa passando ilegalmente pela fronteira é processada criminalmente, enviada para cadeias federais e isolada de qualquer menor que a acompanhe. Publicamente, essa doutrina é justificada por racismo e discriminação contra latinos, mas, por trás do fanatismo, há pura ganância: a política serve para alimentar a milionária indústria penitenciária estadunidense. O problema é que crianças, ao contrário dos adultos, não podem ficar em prisões. Então, elas são separadas dos pais e levadas a grandes depósitos onde são mantidas enjauladas. O Departamento de Segurança Doméstica confirmou que pelo menos 2.300 crianças e adolescentes foram isoladas nesses estabelecimentos. Várias organizações, como a Igreja Católica, associações de saúde mental e até a ONU fizeram declarações denunciando a prática como uma forma de abuso infantil.
Pressionado por todos os lados, Trump cedeu e assinou um decreto suspendendo a política, obrigando que as famílias se mantenham juntas enquanto esperam os processos legais. Mas engana-se quem acredita que os choros infantis seriam capazes de comover a impiedosa administração Trump. Mesmo diante do clamor popular contra o marido, Melania enviou uma mensagem nada discreta ao público: ao fazer uma visita a crianças migrantes, a primeira-dama vestiu um casaco com a frase “Eu realmente não ligo, e você?” estampada nas costas.
Milhares foram às ruas nos Estados Unidos, líderes de várias nações condenaram sua barbaridade e 17 estados estão processando Trump, respostas ao choro irrespondível das crianças latinas.
Sim, nós ligamos, Melania.
Caio Santos
Jornalista e comunicólogo graduado pela UFMG e apoio técnico do GrisLab