Usuários das redes sociais utilizaram a hashtag #BombrilRacista para denunciar a existência da esponja de aço Krespinha, que associava cabelos crespos e o produto. Em resposta à pressão de consumidores, a marca anunciou a retirada do produto do mercado e a revisão de sua estratégia de comunicação.
Em 17 de junho de 2020, a hashtag #BombrilRacista denunciava a existência da esponja Krespinha, comercializada desde 1952. O produto, anunciado no site institucional da Bombril, gerou indignação entre as pessoas pela associação com os cabelos crespos. Pessoas negras passaram a debater a problemática racista, que levou Bombril a se posicionar. Até mesmo a Agência África, que atendeu a conta da marca até 2018, precisou se posicionar.
Bombril é a marca mais popular deste segmento, tanto que se tornou metonímia e, em função da cultura racista do Brasil, associa-se os cabelos crespos à marca. Para as pessoas negras, o cabelo é importante elemento de afirmação de identidade, mas é também um dos elementos mais utilizados para a violência racista. Por esta razão, a descoberta sobre o produto mobilizou as redes sociais. Em 1952, um anúncio de Krespinha associava o produto a uma criança negra e uma concorrente (Assolan), utilizou crianças brancas com perucas feitas de esponja de aço – remetendo à textura do cabelo estilo Black Power – em um comercial de televisão, no início dos anos 2000. O mesmo foi feito também pelo estilista Ronaldo Fraga em 2013, quando utilizou perucas feitas de esponja de aço em modelos, majoritariamente brancas, em um desfile do São Paulo Fashion Week.
A violência contra pessoas negras se dá na avaliação do cabelo liso como “bom” e do crespo como “ruim” e em ofensas que surgem daí. Movimentos negros, organizados em rede, trabalham estratégias de empoderamento na contemporaneidade. A estética é fortemente valorizada neste contexto, sobretudo a partir do estímulo à transição capilar, ato de assumir as texturas naturais do cabelo. Hoje, várias marcas comercializam produtos direcionados aos cuidados dos cabelos crespos naturais, mas este é um fenômeno recente. Há também reivindicações sobre maior representatividade e melhores formas de representação das pessoas na mídia, mas são confrontadas por discursos racistas, como ocorreu com o Boticário e com a youtuber Ana Clara Barbosa.
Bombril assumiu sua responsabilidade e informou que iria retirar Krespinha do mercado e reveria toda sua estratégia de comunicação a fim de não reforçar novos estereótipos racistas e demais discriminações. Pode ter sido uma mobilização espontânea de sujeitos das redes sociais. No entanto, há dúvidas se a mobilização foi provocada pela própria marca, com objetivo de trazer seu nome à mídia de forma espontânea para se posicionar favorável à causa antirracista, na onda dos movimentos Black Lives Matter das últimas semanas.
Independente disso, chama atenção a pressão da sociedade para que marcas adotem discursos mais plurais, diversos e antirracistas, demonstrando a força do consumo político, por meio dos buycotts (ato de comprar um produto por ser favorável ao posicionamento político da marca) e dos boycotts (deixar de comprar um produto por ser contrário ao posicionamento político da marca).
Pablo Moreno Fernandes, Doutor em Ciências da Comunicação pela ECA-USP, professor do Departamento de Comunicação Social da UFMG