Análise | Questões raciais

#ÉCoisadePreto: a hashtag que resignificou uma expressão racista

Um vídeo com um comentário racista do jornalista William Waack virou notícia na internet e mobilizou a opinião pública. O acontecimento suscitou muitas reações nas redes e afetou milhares de pessoas nos mostrando como o racismo ainda é um problema grave e estruturante em nossa sociedade – mas que, no mínimo, não é mais invisível.

Colagem de fotos: Revista Fórum.

A internet e as redes sociais são um terreno fértil para que os acontecimentos circulem ampla e rapidamente, afetando nossa experiência, mobilizando os olhares de milhares de pessoas, suscitando debates e pautando as conversas do nosso dia a dia. Recentemente, o jornalista e apresentador William Waack foi acusado de racismo e afastado do trabalho na Rede Globo de Televisão. A partir de um vídeo dos bastidores do Jornal da Globo que circulou na internet, este acontecimento repercutiu e afetou diversas pessoas.

É certo que ainda estamos longe de considerar que o racismo seja um problema social superado, mas é importante reconhecer algum avanço. Pouco tempo atrás a discriminação racial não era passível de punição e sequer era condenada pela opinião pública. Hoje, o racismo pode ser punido como crime e qualquer atitude racista que circula na internet, nas redes sociais ou nos noticiários ganha visibilidade, suscita um debate público e desperta reações de reprovação.

A expressão “coisa de preto” é bastante conhecida e por muito tempo tem sido utilizada com um tom pejorativo e discriminatório. Ouvimos dizer que algo é “coisa de preto” para qualificar determinadas atitudes como ruins, malfeitas e desprezíveis – e “preto” é usado como um adjetivo bastante negativo. Por muito tempo esta expressão foi repetida e até naturalizada, o que nos mostra o quanto a questão do racismo é séria e continua presente em nossa realidade social. O caso de William Waack se enquadra como um exemplo desse uso.

Porém, a atitude racista do jornalista, afetando diversos públicos, encontrou ecos contrários. Criou-se como resposta a hashtag #ÉCoisaDePreto: várias personalidades famosas foram convocadas pelas postagens e milhares de pessoas começaram a publicar frases e comentários nas redes sociais, ressignificando a expressão “coisa de preto” como algo positivo, admirável, digno de aplausos. A expressão circulou na internet mostrando nomes e rostos de negras e negros que tiveram muita importância na história da humanidade. Estes são alguns dos exemplos que circularam:

#ÉCoisaDePreto ser um dos maiores escritores do mundo

#ÉCoisaDePreto ser um dos maiores nomes da música mundial

#ÉCoisaDePreto ser campeão olímpico

#ÉCoisaDePreto libertar todo um país

Outra reação nas redes sociais foi a hashtag #ÉCoisaDeBranco, que circulou com postagens comentando atitudes negativas e posturas condenáveis de várias pessoas brancas famosas como, por exemplo, Danilo Gentili, Rachel Sheherazade e o Pastor Marcos Feliciano.

O racismo é um problema sério em nosso país. Trata-se de uma questão estruturante da sociedade brasileira, um problema social e político enraizado em nossa cultura e em nossas práticas sociais. Mas a reação massiva ao acontecimento analisado nos mostra a potência de mobilização contra essas práticas. O ideal seria que, a essa altura do campeonato, em 2017, o racismo tivesse deixado de ser uma realidade por aqui; em todo caso, podemos considerar que hoje o problema, ao menos, não é mais invisível.

Maíra Lobato
Mestre pelo PPGCOM-UFMG



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