No período em que a Igreja Católica se prepara para sua maior festa, a Páscoa, católicos do Brasil e de outras partes do mundo são convocados a permanecerem em suas casas como um gesto concreto de cuidado com o próximo.
Antes mesmo dos casos de coronavírus se espalharem pelo Brasil, muitos católicos já estavam atentos à sua chegada ao Vaticano. A aparição do Papa Francisco resfriado levantou suspeitas de que ele poderia ter contraído o vírus, o que foi negado. Diante da disseminação de casos na Itália, ele suspendeu suas celebrações com presença de fiéis e também aparições públicas na Praça São Pedro, tornando a televisão e as mídias sociais seus principais canais de comunicação.
Seguindo os passos de Francisco, vários bispos brasileiros começaram a tomar algumas medidas preventivas em suas dioceses, como a suspensão do abraço da paz e também da comunhão diretamente na boca. Na internet, a medida gerou controvérsia principalmente entre os católicos mais conservadores. Alguns vídeos, inclusive de religiosos, questionavam a medida, interpretada como exagerada e até ineficaz.
Atitudes mais drásticas começaram a ser tomadas pelo Ministério Público e também pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) a partir do dia 14 de março. A primeira veio da Justiça, que determinou a suspensão, por um mês, das missas e outros eventos no Santuário Nacional de Aparecida, maior templo católico do país. No mesmo dia, em nota, a CNBB recomendou a suspensão de todo tipo de atividade e evento com aglomeração de pessoas, recomendando, inclusive, que idosos e pessoas dos grupos de risco participassem das missas em casa.
A suspensão das missas públicas veio poucos dias depois, variando de diocese para diocese. Na arquidiocese de Belo Horizonte, a medida começou a vigorar no dia 18 de março. Já na Arquidiocese de São Paulo — local que registrava o maior número de casos – o discurso a princípio foi de aumentar o número de celebrações como forma de evitar aglomerações. Criticado, Dom Odilo Scherer só suspendeu as celebrações públicas a partir do dia 21.
Ainda que enfrente discursos dissonantes vindos de fiéis e de alguns líderes religiosos, a Igreja Católica, por contar com uma organização em nível mundial (Vaticano), nacional (CNBB) e local (Dioceses), tem conseguido tomar medidas unificadas de combate ao coronavírus. A suspensão das missas e outras atividades pastorais é um avanço, visto que parte considerável dos fiéis católicos brasileiros — 25% segundo pesquisa do Data Folha — tem mais de 60 anos.
Entre as ações da Igreja Católica, um ponto que chama a atenção é sua presença nas redes sociais. Canais católicos no rádio, na televisão e até mesmo na internet não são novidade. No entanto, o que vemos agora é um movimento local das paróquias, com transmissões diárias de missas e outras atividades.
Percebemos também por parte dos bispos brasileiros um discurso que convoca os fiéis a uma rede de oração sem deixar de lado as orientações da Organização Mundial da Saúde. Em tempos de crescente fundamentalismo cristão, o distanciamento de uma concepção de fé “mágica”, “que livra de todo mal” é fundamental para que os fiéis sigam as orientações das autoridades sanitárias e valorizem o papel da ciência.
No momento em que a Igreja Católica vive o período quaresmal, no qual práticas como jejum, oração e caridade são incentivadas, outro importante valor que aparece é a necessidade do cuidado e da solidariedade. Além de uma rede de oração, cabe também à Igreja Católica intensificar suas ações de caridade e encontrar novas formas de atuação e fortalecimento de suas pastorais sociais, de modo que pessoas em situação de rua, presidiários, crianças e outras pessoas em situação de vulnerabilidade continuem encontrando amparo em tempos de pandemia.
Fabíola Souza, professora da UFOP e pesquisadora do GRIS