Análise | Internacional

Mais uma crise no Oriente Médio

No complicado conflito que envolve Teerã, Riad e Washington, a antiga aliança entre americanos e sauditas passa por um teste com o ataque às petrolíferas na Arábia Saudita – a estratégia iraniana é perigosa e a reação americana aponta para mudanças geopolíticas.

Foto: Reuters.

No dia 14 de setembro, petrolíferas da Arábia Saudita foram atacadas por dez drones. Quem reivindicou a ofensiva foram os houthis, rebeldes do Iêmen. O país revidou e esse foi só o início de mais um acontecimento relacionado ao controle de petróleo e ao Oriente Médio.

Aramco, a petroleira saudita mais valiosa, tem usina em uma das duas cidades alvo: Abqaiq (a outra é Khurais), onde passam ⅔ dos 10 milhões de barris produzidos diariamente pelo país. Pelo valor do petróleo e a centralidade do território na geopolítica global, os ataques revelam estratégia refinada e estão sendo nomeados como “11 de setembro do petróleo”.

Os EUA acusaram o envolvimento do Irã no caso e foram apoiados por Grã-Bretanha, França e Alemanha. Há quem diga que esse ataque pode tratar-se  “de uma clara demonstração de força e audácia dos iranianos”, inimigos históricos da monarquia Saudita. O ataque é considerado uma sequência da escalada nuclear protagonizada pelo Irã, que, ameaçado de ser estrangulado economicamente pelas sanções americanas, começou a investir novamente em suas atividades nucleares. A escalada nuclear é responsável, inclusive, pela multiplicação de incidentes, que culminou com o ataque a um drone americano, em junho deste ano.

Apesar da tensão internacional, represálias bélicas contra o Irã são complicadas de serem postas em práticas, pois possuem o potencial de fazer explodir os conflitos da região. O risco é maior, portanto, porque pode ser o pontapé para uma guerra grande e durável, o que desestabiliza a economia mundial. Sem entrar em conflito direto até o momento, Riad e Teerã apoiam outros agentes da região do Oriente Médio, espalhando sua influência e tentando se sobressair no território. Do lado saudita, temos o Bahrein e os Emirados Árabes Unidos, Egito e Jordânia, além dos EUA de Trump e de Israel. Os iranianos, por sua vez, além de financiarem os rebeldes do Iêmen, segundo relatórios da ONU, também são aliados do Iraque e da Síria.

Para Trump, apesar dos clássicos tweets agressivos, não é interessante fazer uma nova guerra no Oriente Médio, tendo em vista a sua campanha de reeleição à presidência, que tem como promessa justamente o contrário. A estratégia assumida por ele, então, é a de pressão máxima à Teerã e não a de um contra-ataque: a aplicação de novas sanções ao país, que já sofria com outros severos ataques econômicos. Assim, novas sanções, ao invés de uma declaração de guerra, podem ser consideradas um recuo americano e uma chance para aplicar a difícil diplomacia entre os países. Essa atitude chama atenção por colocar em xeque a regra até então inabalável de que a Arábia Saudita era “protegida” pelos EUA.

A escalada da tensão na região não acabou e uma guerra não pode ser descartada. Isso é preocupante pelas implicações que poderia ter em escala global: como ficaria a produção e distribuição de petróleo? Quem controlaria a região? E as influências dos EUA e países da UE?

Os conflitos geram consequências não só para os atores diretamente envolvidos, mas para todos que dependem dos combustíveis fósseis, incluindo o Brasil: a Petrobras alegou que não acompanharia a alta de preços do mercado internacional, mas quando o preço do petróleo sobe, vemos o efeito cascata na gasolina, no etanol pela maior procura, no botijão de gás, gás natural e no querosene de aviação e passagens aéreas. Enquanto o capitalismo, as cadeias produtivas e o próprio modo de vida se apoiarem no petróleo, os acontecimentos no Oriente Médio terão consequências no mundo inteiro.

Chloé Leurquin, doutoranda em Comunicação Social pela UFMG e pesquisadora do Gris

Laura Lima, mestra em Comunicação Social pela UFMG e colaboradora do GRIS.



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