Perseguidos pelo Império Romano e pelos líderes judeus, os primeiro cristãos não podiam expressar sua fé publicamente, sendo a casa o principal espaço de convivência das primeiras comunidades. Séculos depois, católicos se deparam com uma situação semelhante. Mas por um motivo bem diferente: o coronavírus.
Com a chegada da Semana Santa e da Páscoa, a Igreja Católica precisou adaptar suas celebrações. Para evitar possíveis contaminações, ritos litúrgicos como o lava-pés na Quinta-feira Santa e o beijo da cruz na Sexta-feira Santa foram omitidos, assim como o batismo dos catecúmenos na celebração da Vigília Pascal.
Sem poder comparecer às missas, os católicos brasileiros foram incentivados a usar símbolos da religiosidade popular e acompanhar as transmissões das celebrações em casa.
No Domingo de Ramos, o convite era prender na porta ou no portão alguns ramos, comuns nas procissões do dia. Na Quinta-feira Santa, que recorda a instituição da eucaristia e o lava-pés, a recomendação era colocar em local de destaque da casa uma toalha e um jarro com água. Alguns padres também abençoaram pães. A Sexta-feira Santa teve como principal símbolo a cruz, sendo as famílias convidadas a marcarem as portas com esse sinal. Já a vela foi o principal símbolo do Sábado Santo e no Domingo de Páscoa, o pano branco — recordando o sudário deixado no túmulo — com flores, elemento que durante toda a quaresma é omitido das igrejas.
As transmissões das celebrações da Semana Santa permitiram não só um aumento da audiência das emissoras católicas — a TV Aparecida ficou em terceiro lugar em audiência durante a veiculação da missa de Páscoa —, como a intensificação da atuação das igrejas locais nas redes sociais. Algumas paróquias, de forma mais organizada, contam com o trabalho da Pastoral da Comunicação, outras com a boa vontade de fiéis, que atuam de forma totalmente amadora e tendo à disposição poucos recursos técnicos.
Mais do que intensificar a presença católica nos meios de comunicação, a Semana Santa também proporcionou à Igreja um reencontro consigo mesma. Como marco do período Pascal, ela lançou a Ação Solidária Emergencial da Igreja no Brasil, que incentiva não só a ajuda material às pessoas, como também busca promover o cuidado no campo religioso, humano e emocional. Por meio desse gesto, a Igreja parece redescobrir seu papel como agente da solidariedade e do cuidado e também a importância de manter suas portas abertas para os mais vulneráveis.
Fabíola Souza, professora da UFOP e pesquisadora do Gris