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BBB20: final histórica para uma edição histórica

Com dez pontos de audiência a mais que o programa anterior logo na estreia, um participante que mais vezes foi ao paredão na história e uma votação recorde que entrou para o Guinness World Records, a final do BBB20 e a vencedora não poderia ser menos que histórica.

Thelma é a campeã do ‘BBB20’. Foto: Reprodução / Globo

“Uma temporada histórica como essa não podia terminar sem uma vitória histórica. Esse prêmio só pode ser seu, esse prêmio tem que ser seu, Thelma!”. Foi assim que o apresentador do Big Brother Brasil 20, Tiago Leifert, anunciou a vitória da médica Thelma Regina Maria dos Santos Assis.

Não há exagero em pontuar essa temporada do programa como histórica, não só pelo resultado da final, mas também pela forma como o último mês do confinamento se desenrolou para quem estava dentro e fora da casa. No meio do BBB, uma pandemia de escala global chegou ao Brasil, retirou da grade da Rede Globo a maior parte de sua programação de entretenimento e mudou a interação tanto entre a produção e os brothers, quanto entre o público e o programa. Não havia mais novos capítulos de novelas, futebol, noite de eliminação com a presença dos familiares e da torcida dos confinados e nem programas de auditório: o que restou de entretenimento “inédito” na grade da emissora foi o Big Brother Brasil.

A novela das 9 que o país podia acompanhar eram os paredões quase semanais com Babu Santana, as coreografias ensaiadas por Manu Gavassi e performadas pelos participantes durante as festas e os dilemas que antecediam as formações de paredão, provas do líder e eliminações. Isso explica, inclusive, o investimento da emissora  e dos participantes em produzir VTs elaborados e emocionantes, que viraram propaganda do serviço de streaming da emissora e arrancaram lágrimas, ao vivo, do apresentador Tiago Leifert.

A grande final do BBB20 foi, de muitas maneiras, coerente com a construção da narrativa e dos acontecimentos que marcaram a temporada. Assim como nas outras edições, a escolha do elenco foi milimetricamente calculada a fim de criar situações de conflito, mas, nessa edição, o desenrolar desses conflitos conseguiu cativar os telespectadores de uma maneira única. Após um episódio onde as mulheres do reality se uniram para confrontar os homens sobre suas posturas machistas, a casa passou a formar grupos muito parecidos com as dinâmicas sociais presentes na sociedade, em que as identidades e amizades se afirmam por meio da confluência entre visões de mundo e valores.

Desse modo, assistimos, ao longo do programa, à formação, para além da divisão formal entre Pipoca e Camarote, ou da Xepa e Vip, de outros agrupamentos de participantes, como a “comunidade hippie” e as “fadas sensatas”. Esse caldeirão de subjetividades políticas diversas, alimentadas tanto pelos conflitos de convivência como pela própria trajetória dos participantes fora da casa, gerou uma narrativa interessante, que, por sua vez, fomentava debates acalorados nas redes sociais sobre questões de gênero, raça e classe, e que também contribuiu para a formação da final. Em 20 edições do programa, essa foi a quarta final formada exclusivamente por mulheres.

Como o próprio apresentador afirmou no discurso de eliminação de Babu Santana, que foi um dos favoritos para vencer o programa, o BBB20 foi marcado por tensões políticas entrecruzadas, onde se destacaram duas: as questões de gênero e raça. Na final, em que Thelma era a única mulher negra, isso ficou ainda mais evidente: o próprio Babu Santana afirmou que torceria por Thelma por ela ser “um símbolo do BBB”, e grande parte da torcida de Thelma era composta por mulheres e/ou por pessoas negras, que, ao declararem sua torcida, diziam se identificar com a médica e com ideais antirracistas e feministas. Nesse sentido, o resultado da final não poderia ser diferente: Thelma era a única representante desse entrecruzamento de lutas.

Atualmente, a maioria dos participantes do BBB sai da casa com a conta do Instagram recheada de novos seguidores. Contudo, chegar até a final ainda é um dos acontecimentos de maior visibilidade e rende dois grandes “prêmios” aos finalistas: o dinheiro e a fama. Nesse sentido, Manu e Rafa também saem como vencedoras, por conseguirem se projetar nacionalmente, sem precisarem necessariamente do dinheiro pra isso. Enquanto Thelma consegue o que poucas pessoas negras conseguem: se tornar milionária, no Brasil, em apenas três meses.

Mayra Bernardes, mestre em Comunicação pelo PPGCOM/UFMG e pesquisadora do Gris e do Coragem
Barbara Lima, mestranda em Comunicação pelo PPGCOM/UFMG e pesquisadora do Gris



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