O ano de 2017 chegou ao fim e, com ele, o quarto ano de atividade do Laboratório de Análise de Acontecimentos, o GrisLab. Neste ano, foram publicadas 74 análises sobre 17 temáticas distintas, das quais cinco se destacaram: Política[1], Crimes[2], Celebridades[3], Mídia[4] e Gênero[5].
Em números
Este foi mais um ano em que o cenário político brasileiro foi bastante movimentado, com a deflagração de operações importantes como a Operação Carne Fraca, o processo controverso de implantação/aprovação de diversas reformas propostas por Michel Temer e a prisão e investigação de políticos importantes, como os ex-governadores do Rio de Janeiro, Anthony Garotinho e Sérgio Cabral, e o senador por Minas Gerais, Aécio Neves. Esses e outros acontecimentos políticos foram analisados pela nossa equipe 26 vezes em 2017, sendo a temática mais recorrente do laboratório neste ano.
Em segundo lugar, foram 11 análises sobre acontecimentos atravessados pela temática Crimes, também muito recorrente em 2017. Como destaques, temos o ataque a uma creche em Janaúba/MG, o suicídio do reitor da UFSC, a greve dos policiais no Espírito Santo e as chacinas que ocorreram no início do ano em presídios da região Norte e Nordeste do Brasil.
Em terceiro e quarto lugares estão as temáticas diretamente relacionadas com o interesse de pesquisa de integrantes do Gris: as Celebridades e a Mídia. Nas análises sobre celebridades, destacamos o poder de afetação de seus discursos e práticas em espaços de alta visibilidade, que renderam a demissão/afastamento de figuras públicas importantes em função de denúncias de assédio e racismo, como no caso de José Mayer e William Waack. Já nas análises focadas na mídia, os destaques ficaram por conta de campanhas publicitárias e programas de TV que propuseram discussões sobre temas já recorrentes no GrisLab, como gênero, sexualidade e raça. Como acontecimentos marcantes, tivemos o final da novela “A Força do Querer”, que conseguiu superar os números baixos de audiência que vinham sendo experimentados nas novelas do horário nobre da Rede Globo, e os boicotes e problematizações em torno de campanhas publicitárias de marcas famosas, como a Omo e a Friboi.
Por fim, houve alta recorrência de análises de acontecimentos perpassados pelas questões de Gênero, que este ano foram acionadas recorrentemente a partir de casos de assédio que ganharam as manchetes após denúncias de mulheres famosas e anônimas.
Em fatos
E o que os acontecimentos observados em 2017 revelam? Em nossas análises, observamos uma série de derrotas.
Como demonstrou levantamento da Agência Pública, “indígenas, quilombolas e trabalhadores estão entre os que mais perderam direitos constitucionais no governo Temer; saúde, educação e meio ambiente também foram afetados”. Começamos a sofrer as consequências da PEC 241/55, aprovada em 2016, que congelou os investimentos públicos.
Em março, perdemos direitos quando – mesmo com manifestações contrárias – o Congresso aprovou a lei de terceirizações. Em abril, perdemos quando uma manifestação legítima não conseguiu sequer a visibilidade adequada e, como provocou a Ombudsman da Folha de São Paulo, “o bom jornalismo aderiu à greve geral: não compareceu para trabalhar”. Temer respondeu chamando as reformas trabalhista e da previdência propostas por ele de “modernização das leis” e destilou o seu típico machismo: “os governos precisam passar a ter marido”.
As mulheres têm perdido muito e os indígenas perderam demais. Abril foi o mês do ataque aos Gamela no Maranhão e por aqui refletimos que “estamos longe geograficamente dos Gamela, mas também próximos, porque estamos enredados numa teia de decisões políticas que põe em dissenso projetos nacionais, ideais sobre desenvolvimento e progresso, formas de vida e mundos distintos.”
Em maio, perderam-se as máscaras: a república ficou nua com a divulgação do conteúdo de áudios comprometedores do senador Aécio Neves e do presidente Michel Temer. O Congresso foi, mais do que nunca, a “casa da mãe Joana”.
Em junho, perdemos o bom senso: enquanto muitos se manifestaram pelo (in)justiçamento quando apoiaram nas redes sociais um jovem de 17 anos ter a testa tatuada com os dizeres “eu sou ladrão e vacilão”, a chapa de Temer era absolvida no TSE – em um julgamento que provavelmente teria resultado diferente se Dilma Rousseff ainda fosse a presidenta. No mês seguinte, o governo federal parecia estar perdendo os apoiadores, mas não por muito tempo. Em agosto, perdemos quando uma denúncia de crime cometido pelo presidente não pôde ser investigada. Os fatos falaram por si sós.
Em setembro, parecemos ter perdido a memória: o fantasma do autoritarismo assombrou quando Zezé Di Camargo, uma celebridade que se diz politizada, negou que tenhamos tido uma ditadura militar – enquanto um general do exército levantou a possibilidade de uma “intervenção”, sem sofrer, naquele momento, sanção alguma.
Em outubro, Belo Horizonte perdeu com as polêmicas que ocorreram entre a autointitulada bancada cristã da Câmara Municipal e a Secretaria Municipal de Educação. Não isolada do cenário nacional, a um ano das eleições, as disputas no “mar agitado da superfície dos nossos tempos hodiernos esconde planos bem maiores em seu interior, e não é sobre a proteção de nossas crianças e adolescentes.” Vivemos o risco do crescimento de bancadas com viés religioso fundamentalista e a ascensão de projetos perigosos como os de escola sem partidos, cura gay, entre outros.
No mesmo mês de outubro, pequena vitória: a ministra do STF Rosa Weber concedeu uma decisão liminar para suspender a portaria 1.129, aprovada pelo Ministério do Trabalho, que dificulta a fiscalização do trabalho escravo. A demanda por regras “flexíveis” veio e continuará vindo da bancada ruralista.
Rosa Weber acertou naquela e em outras ocasiões, mas seu colegas não têm orgulhado muito os brasileiros, por vários motivos. Foi em outubro que o plenário do Supremo contrariou sua jurisprudência ao deixar a cargo do Senado aceitar ou não medidas cautelares impostas ao senador Aécio Neves pela primeira turma do próprio STF. Resultado: a “doutrina Aécio” passou a ser usada nos meses seguintes para reintegrar parlamentares investigados e presos às suas funções legislativas.
Em novembro, perdemos mais um pouco do respeito, da igualdade, da justiça, “centrais nos rumos da própria democracia”, quando a filósofa Judith Butler e sua companheira, a cientista política Wendy Brown, foram agredidas em suas passagens pelo Brasil. Também perdemos mais direitos e recursos públicos com a aprovação da reforma trabalhista e a MP do trilhão (que, como você confere no Congresso em Foco, concede isenção fiscal para petrolíferas estrangeiras). A mesma lógica privatista vem se desenhando para a Eletrobras, a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil .
Em dezembro, perdemos de vista garantias constitucionais básicas e o respeito entre instituições, quando dirigentes da UFMG foram levados coercitivamente a depor pela Polícia Federal a propósito de possíveis irregularidades na construção do Memorial da Anistia – antes de qualquer forma de pedidos de esclarecimento. Repetindo intervenção de mesma natureza que teria levado ao suicídio do reitor da UFSC, em setembro, o autoritarismo mostrou suas garras mais uma vez.
As derrotas de 2017 são consequência, em grande medida, do maior acontecimento do Brasil em 2016: o impeachment que destituiu a presidenta Dilma Rousseff do governo. Os mesmos deputados que aprovaram pautas-bomba e se “indignaram com pedaladas” no ano anterior, em 2017 deram sobrevida política ao presidente grampeado, alegando defender uma suposta estabilidade econômica, quando na verdade se vendiam com a aprovação de emendas parlamentares (até a grande mídia abordou muito o assunto).
Evidente que não começamos a perder neste ano, tampouco em 2016. E o impacto das derrotas continuará muito depois do dia 31 de dezembro. As perdas estimularam algumas lutas e resistências este ano, e podem impulsionar lutas e vitórias em 2018. Nos veremos nas redes, nas mídias, nas ruas, nas urnas. Até o ano que vem!
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A equipe do GrisLab continuará recebendo sugestões e, eventualmente, analisando acontecimentos no mês de janeiro. Em fevereiro, voltaremos com novidades! Desejamos boas festas e um 2018 muito melhor!
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[1] Na categoria Política, aninhamos as análises referenciadas com esta palavra-chave (24) e também com a palavra chave Corrupção (2), cujo conteúdo se relacionava fortemente com essa categoria.
[2] Na categoria Crimes, aninhamos as análises referenciadas com esta palavra-chave (2), e com outras correlatas: Violência (6) e Justiça (3).
[3] Na categoria Celebridades, aninhamos as análises referenciadas com esta palavra-chave (7) e também com a palavra-chave Morte (2), que continha duas análises sobre a morte de figuras públicas importantes.
[4] Na categoria Mídia, aninhamos as análises referenciadas com as palavras-chave Publicidade (2) e TV (4).
[5] Na categoria Gênero, aninhamos as análises referenciadas com esta palavra-chave (2) e também com as palavras-chaves Machismo (3) e Mulheres (1).
Equipe do GrisLab